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Sergio Rodrigues

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SERGIO RODRIGUES



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É inegável a contribuição de Sergio Rodrigues (arquiteto, designer de produto, designer de interiores, cenógrafo, ambientador, decorador e palestrante) à gestação do móvel moderno verdadeiramente brasileiro, atividade à qual vem dedicando sua energia criativa ao longo de sua vida. É um obstinado que vem atravessando as décadas em estado de permanente criatividade e produção, a despeito das várias diversidades que foi enfrentando ao longo do caminho.

Sergio Rodrigues fez da criação de móveis, e de móveis de madeira, seu foco de atuação contínuo e preponderante. Em suas contas acumula, em pouco mais de meio século de estrada, a surpreendente marca de cerca de 1.200 diferentes modelos de móveis. O fio que conduz essa fertilíssima atuação é a busca de um design verdadeiramente brasileiro. Seu móvel parte das nossas mais profundas raízes culturais, mas não se limita a elas. Ele construiu uma linguagem muito particular, em que recria o móvel robusto da tradição ibérica, mas dentro de uma sintaxe moderna.

Outra contribuição fundamental de sua ação foi ajudar a tirar o design de interiores do signo da futilidade e da exibição de status social para colocá-lo dentro do domínio da cultura.

Nascido em 1927 no Rio de Janeiro, teve com uma das influências mais marcantes seu tio-bisavô James Andrew, com quem aprendeu a conhecer e respeitar a madeira. Aos 20 anos de idade Sergio entrou na Faculdade Nacional de Arquitetura da Universidade do Brasil e, recém-formado, em 1952 participou da equipe que se encarregava de um grande projeto de arquitetura, o Centro Cívico.

Abriu com dois designers italianos, os irmãos Carlo e Ernesto Hauner, a Móveis Artesanal Paranaense, a primeira loja de arte e mobiliário moderno da cidade. Acompanhou Carlo Hauner que, com outros sócios, criou em São Paulo a Forma, expressiva indústria de móveis, porém filiada à linguagem funcionalista que dominava o design internacional. Sergio chefiou o departamento de criação de arquitetura de interiores da empresa.       

Um ano após voltou ao Rio e decidiu então apostar todas as fichas no que seria o projeto de sua vida: a criação da Oca, um misto de loja, galeria de arte e estúdio, que em pouco tempo se tornou um ponto de encontro da intelligentsia carioca. Sergio passou a representar, nos interiores, a mesma efervescência que gerava a bossa nova, o cinema novo, o concretismo e o abstracionismo nas artes visuais, o fim do academicismo no teatro e o modernismo na arquitetura.

A aposta no Brasil ficara clara já ao batizar de “Oca” o seu empreendimento. “A simples escolha do nome define o sentido da obra realizada por Sergio Rodrigues e seu grupo”, escreveu o arquiteto e urbanista Lucio Costa, que foi o primeiro a constatar a presença desse caráter de brasilidade na obra do designer.

Sergio passou a se aprofundar, então, na sua mais célebre criação, a poltrona Mole, nascida em 1957. Um modelo em jacarandá torneado e percintas em couro, sobre as quais dispôs um almofadão composto de quatro partes interligadas. Suas principais características: a robustez e o conforto, o convite ao relaxamento e à informalidade. Em 1961, inscreveu-se com a poltrona no IV Concorso Internazionale del Mobile em Cantù – Itália, sagrando-se vencedor entre 438 concorrentes de 27 países diferentes.

A poltrona Mole se tornou um ícone, talvez a peça de design brasileiro individualmente mais conhecida. Maria Cecília Loschiavo dos Santos, filósofa e historiadora do design brasileiro escreveu: “O desejo imperioso de conceber um móvel que expressasse a identidade nacional levou Sergio Rodrigues a um desenho que burlou os padrões reinantes: aos delgados e elegantes pés de palitos, a Mole respondeu com a grossura e a robustez do jacarandá brasileiro. Isso já era uma grande revolução. Um dos aspectos que se destaca vivamente nesse projeto foi a tentativa do designer de ir ao encontro dos novos hábitos de sentar que então emergiram principalmente certa informalidade muito peculiar do comportamento carioca, que Sergio soube tão bem captar e expressar em seu móvel.”

Sergio recebia encomendas do governo também para dar a feição do móvel brasileiro fora do país. O projeto mais significativo foi para a Embaixada do Brasil em Roma, em 1959.

Em 1956 abriu uma indústria no Rio de Janeiro, batizada de Taba; em 1965, inaugurou uma mega fábrica com 10 mil metros quadrados de área coberta, num terreno dez vezes maior, em Jacareí, no interior de São Paulo. Problemas na administração da sociedade, contudo, levaram-no a sair da Oca, tanto da loja quanto da fábrica.

A imensa capacidade criativa de Sergio Rodrigues não foi acompanhada de uma habilidade no trato dos negócios. Felizmente, a tarefa administrativa pôde ser assumida por Vera Beatriz, uma antiga namorada da adolescência. Desde então, a produção de seus móveis passou a ser feita por fornecedores contratados caso a caso e, em 2000, Gisele Schwartsburd, de Curitiba, decidiu abrir a Lin Brasil, uma empresa apenas para produzir apenas suas peças.

Sem as preocupações da produção, Sergio pôde dar vazão à sua proverbial criatividade. Desde a década de 1970 até hoje vem projetando sem parar, como uma verdadeira “usina de idéias”, termo muito empregado nos escritos sobre ele.

Elegeu o jacarandá, madeira nobre, resistente e fácil de trabalhar, como a sua preferida. Mas o uso indiscriminado dessa espécie e o contrabando em toras para o exterior levaram a seu esgotamento, e desde os anos 1980 o designer vem usando mandieras como o eucalipto, a imbuia, o pau-marfim, o tauari etc.

A palhinha e o couro – materiais cuja tradição remonta ao móvel colonial brasileiro – entram como coadjuvantes importantes em sua criação, e em algumas poucas peças seu uso chega a sobrepor-se ao da madeira.

“Sergio Rodrigues criou objetos cujas formas estão muito presentes no imaginário coletivo brasileiro, próximos da terra, da rede, do catre, do sentar do caipira, do jagunço e do matuto, do singelo objeto indígena, do trabalho daqueles dois artesãos que fizeram a cruz do início da história brasileira, no ano de 1500”, diz a estudiosa Maria Cecília Loschiavo dos Santos.

O brilho da poltrona Mole foi tanto que ofuscou o reconhecimento de outras criações igualmente ou até mais impactantes por suas soluções de design. Em cadeiras, Sergio tem pelo menos duas que poderiam ser consideradas suas obras-primas. Uma é a Kilim, de 1973, e outra é a Diz, de 2003, uma poltrona que consegue ser incrivelmente confortável sem um único estofado, totalmente em madeira.

As características de brasilidade estiveram na base do interesse que ele sempre despertou no exterior e das dezenas de reportagens publicadas sobre seu trabalho na imprensa internacional.

Entre 1966 e 1968 seus móveis foram a atração exclusiva da loja Brazilian Interiors da cidade de Carmel, na Califórnia. Em 1974, a poltrona Mole passou a integrar a coleção de designe do Museum of Modern Art (MoMA), de Nova York. Em 1989, o conjunto de sua obra recebeu o Prêmio Lapiz de Plata da Bienal de Arquitetura de Buenos Aires. Em 1993, ele participou da mostra Convegno Brasile – La Costruzione de uma Identita Culturale, em Brescia, na Itália. Em 2004, foi tema da exposição individual Sultan in the Studio, na galeria R 20th Century, em Nova York.        

A saga que lhe coube viver não foi só a sua, mas do país e da atividade a que se dedicou. Ele soube vencer as dificuldades com persistência, capacidade de trabalho, obstinação, energia e com seu ilimitado talento. Ele foi um desbravador não só do design no Brasil, mas também do design do Brasil. Um design que acredita nos valores próprios do país e que busca ser a expressão, na forma, desses valores.




Bibliografia Associada:

Sergio Rodrigues