MATÉRIA DO MÊS
CERTIFICAÇÃO FLORESTAL E AS DISCUSSÕES DA RIO + 20
Publicado por A CASA em 26 de Junho de 2012
Por
Lígia Azevedo

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Nos últimos dias, os eventos da Rio + 20 trouxeram à tona temas abrangentes e ao mesmo tempo convergentes, como as cidades criativas, economia solidária, culturas populares. A certificação florestal, tema de nossa última matéria, também foi um deles.
No dia 17 de junho, uma das mesas do ciclo Diálogos para o Desenvolvimento Sustentável teve como o tema Florestas. Nela, esteve presente o Diretor Executivo da FSC, André Giacini de Freitas levando as pautas do FSC para a Rio + 20. No dia 20, na programação paralela ao Rio + 20, houve ainda o evento “Sistemas de certificação: ligando consumo e produção sustentáveis”, realizado pelo Imaflora em parceria com o FSC e a ISEAL Alliance. E, ainda dentro da programação paralela, uma amostra de produtos da agricultura familiar gerada por meios de produção sustentáveis na Amazônia e Mata Atlântica ocupa a Praça da Sociobiodiversidade até dia 22.
A preocupação com a certificação ambiental está também presente no uso de algumas matérias-primas na própria organização física da conferência: a madeira da construção da infraestrutura e o papel das publicações que estão a cargo do Governo Federal são certificados pelo FSC. O uso dessas duas matérias-primas com certificação baseada em comprometimento governamental é bastante simbólico.
No Brasil, a receptividade de mercado para produtos certificados na indústria de papel e celulose e na comercialização de madeira para a construção civil é bem antagônica. Se no caso do papel os selos verdes são pré-requisito de mercado para muitas empresas, o mesmo não acontece para a madeira.
Leonardo Sobral, do Imaflora, explica: “No mercado de papel a certificação já virou commoditie, vive um boom no Brasil e no exterior. Todo mundo no setor de plantações quer se certificar, senão está fora do mercado. Você encontra papel certificado até no supermercado. As empresas optam pela certificação não só por uma questão de preço, mas por poder com isso entrar em mercados específicos e no mercado estrangeiro, aproximar e fidelizar o cliente, e estabelecer contratos de médio e longo prazo. No caso madeireiro, a certificação ainda é um nicho de mercado. E a tendência é que haja sobrepreço nos produtos. O grosso da madeira amazônica é consumido no mercado interno no ramo da construção civil. E o público em geral, que está construindo casa, fazendo reforma, não tem essa preocupação socioambiental. É preciso de fato haver um despertar ainda maior sobre a questão nesse consumidor”.
Já no processo preparatório da conferência, dentre a série de documentos enviados aos chefes de estado, alguns textos elaborados pelo FSC contém propostas para frear o desmatamento e a degradação florestal, que englobam medidas legislativas, educacionais e econômicas. Entre elas, o comprometimento governamental na criação de incentivos fiscais para os certificados, o incentivo à conscientização a partir do ensino fundamental e o estímulo de mercado através de práticas e promoção de compras públicas sustentáveis. Nesses documentos, são citados exemplos de ações governamentais de países como o Peru, Noruega, Bélgica e Dinamarca.
Mas o crescimento da certificação envolve uma complexidade de questões além dos processos de produção e consumo. Em especial no caso da Amazônia, como aponta Ana Luisa Violato Espada, engenheira de projetos do IFT que coordena pelo IFT o projeto TAA (The Amazon Alternative): “A desestabilização da economia mundial depois da crise econômica de 2008, por exemplo, provocou uma queda na procura por madeira certificada, pois os compradores privilegiaram matérias-primas a preços mais baixos. No caso da Amazônia, outro fator complicador é a questão fundiária. Há vários conflitos de posse de terra na região e as empresas têm dificuldade em realizar o processo de certificação porque não é certo que a terra lhes possui. E grande parte da terra, pertencente às comunidades, não é certificada pois elas não estão preparadas para executar o manejo. Nesse caso, o despreparo remete a problemas relacionado a escolaridade, saúde, segurança, falta de integração social. As comunidades não vão procurar obter o selo antes de resolver esses problemas estruturais básicos”, afirma Ana.
Segundo ela, algumas saídas estão no reconhecimento das terras privadas pelo INCRA e a concessão de áreas florestais públicas, por exemplo. “O valor da concessão sofre um abatimento quando há certificação, e os concessionários têm garantia do ciclo do manejo, pois podem usar a terra por 30, 40 anos. Com essas garantias, aí sim vão investir.”
Leonardo Sobral aponta outro fator complicador, mas acredita que as perspectivas são positivas: “A lei brasileira de manejo é bastante rígida, por outro lado é necessário um passo pequeno para obter a certificação seguindo o manejo florestal descrito nas resoluções do Conama. Mas as empresas não cumprem e os órgãos governamentais não conseguem fazer a fiscalização. E a lei não dá conta de todos os problemas da região, assim como certificação. Mas de uns 5, 10 anos para cá, está havendo uma evolução, seja pela diminuição da ilegalidade ou pela estruturação dos órgãos governamentais. A tendência é que o manejo florestal na Amazônia vá aumentar e, por consequência, a certificação também”.
Vários dos pontos, ainda, remontam às recentes discussões em torno do Novo Código Florestal e da Lei de Gestão de Florestas Públicas, a qual delimita percentuais de terras públicas que podem ser destinadas para o uso de empresas, comunidades ou proprietários privados, e atrela esse uso a um manejo responsável. E aí voltamos novamente ao comprometimento governamental, como endossa Ana. “A certificação obedece às leis do país. Temos que seguir o que for definido pelo governo”, conclui.