Promover uma economia mais justa e solidária, assegurando direitos, estabilidade e desenvolvimento de pequenos produtores e trabalhadores desfavorecidos, em especial no hemisfério Sul. Estes são os princípios fundamentais do comércio justo, movimento oriundo da década de 40, que se tornou a principal pauta de trabalho de diversas entidades por todo o mundo, em especial de produção agrícola e artesanal. Para garantir que estes parâmetros sejam seguidos, existem as certificações ou selos que comprovam o respeito a critérios sociais, econômicos e ambientais.
Entre os critérios para a certificação estão: pagamento de um preço justo pela produção, transparência e confiabilidade em toda a cadeia de comercialização, boas condições de trabalho, igualdade de gênero, não exploração de mão de obra infantil, e respeito ao meio ambiente.
O preço mínimo pelos produtos – uma das principais características dessa certificação – deve ser acordado coletivamente e cobrir os custos de produção ou de fabricação bem como oferecer uma margem de lucro para investimento. Além disso, as certificações preveem contratos de pré-financiamento para investimento na produção e a possibilidade de estabelecimento de relações comerciais de longo prazo. Em alguns casos, há ainda prêmios para a promoção de melhorias na qualidade de vida da comunidade produtora – em educação, saúde, saneamento etc. E, após certo nível de investimento social, também podem ser aplicados recursos em benfeitorias nas propriedades dos associados, decididas também conjuntamente.
Entre as várias organizações certificadoras que existem hoje em âmbito nacional e internacional, as principais são a WFTO (World Fair trade Organization) e a FLO (Fair trade Labeling Organization). Juntas, elas reúnem cerca de 500 entidades em mais de 75 países. Entre as instituições brasileiras que têm a certificação da WFTO estão: Artesol, Mundaréu, Onda Solidária, Visão Mundial, Nusoken, e Gebana Brasil. Os grupos certificados passam por auditorias periódicas para garantir a manutenção dos critérios do comércio justo.
Críticas e pontos polêmicos da certificação
A questão da certificação de artesanato em comércio justo levanta uma série de pontos polêmicos, como comenta a diretora executiva da Mundaréu, Lizete Prata: “Após a certificação, recebemos convites para participar de feiras e eventos internacionais. Mas, no nosso caso, ela não teve muito impacto nos negócios. Como no artesanato não são os produtos que recebem o selo, e sim a associação, fica difícil para o consumidor identificar a certificação”.
Segundo Lizete, o problema mais complexo é a dificuldade de se trabalhar dentro dos princípios de comércio justo no Brasil, na área do artesanato. “Em comparação a outras cadeias de comércio justo internacional que conheci, dadas as suas condições de produção, os produtos aqui acabam tendo custo mais elevado, seja porque vêm de pequenas unidades de produção, seja pela elevada taxação tributária em vigor no país. Também, na formação de preço, na Mundaréu sempre usamos como parâmetro o salário mínimo da categoria produtora. E claro isso que tem maior impacto no custo em comparação à maioria dos produtos feitos em outros empreendimentos que não usam os critérios de comércio justo e trabalham com baixos salários”, explica. “Além disso, as compras têm que ser regulares, porque só assim se constrói uma relação de sustentabilidade entre produtores e comerciantes. Mas, se o produto já nasce com preço mais elevado, não vende na loja. E se não vende, como podemos fazer uma nova encomenda? Fechamos a nossa loja algum tempo depois de perceber que não dá para comercializar dentro dos princípios do comércio justo, somente sendo subsidiado”, conclui.
Algumas das possíveis alternativas para a questão seriam a implementação de políticas públicas para isenção de impostos em toda a cadeia de produção e comercialização, a criação de um sistema nacional de certificação com reconhecimento internacional, a promoção de campanhas de divulgação e conscientização dos consumidores sobre as questões do comércio justo, e a colocação de selos diretamente nos produtos artesanais. “Essas demandas deveriam surgir não de cima para baixo. A iniciativa teria que partir principalmente dos empreendimentos populares que seriam diretamente beneficiados. Cabe a eles se organizarem e colocar a questão em pauta para a sociedade e o governo”, afirma Lizete.