Um galo sozinho não tece a manhã.
João Cabral de Melo Neto
E o desafio foi: como fazer uma corrente que atravessa o mar e liga dois continentes? Por mais ambicioso que possa parecer, é o que o Projeto Corrente faz. Do desafio, herda o fio. Do mar, a correnteza. E os continentes? Há distância maior do que aquela entre dois viventes?
Ao navegar por esse mar, foi esse o fio que Marina decidiu traçar. Convidando artistas para colaborar, cada um investe o tempo tecendo seu fragmento, que mais tarde integra um mais largo tear. Lado a lado, correntes híbridas se dão as mãos: cada qual com seu jeito de ligar. E o resultado, um imenso e crescente colar.
É como as palavras, que também são colares, letras em acordo que deixam passar através si um fio de sentido. Letras sozinhas pouco ou nada dizem, mas contêm o líquido que as aglutina, que se põe a fluir e a correnteza do rio forma. Por vezes, é uma corrente elétrica que liga c, o, r, r, e, n, t, e. Eletrizadas, as letras vibram. E há palavras suaves que são ligadas por correntes de ar, uma lufada que as faz voar e para o norte ou sul planar.
O sentido é o que se busca, seja em cada caráter ou caractere. Cada colaborador da corrente acolhe o sopro que aviva a chama que quer brilhar, ligar, eletrificar, correr, fluir e até outro continente chegar. Generoso e aberto convite, aglutina uma diversidade de elos. Os encaixes não residem na similaridade das formas, mas no que as habita: a correnteza desejante que correntes quer gerar, gente agregar e uma novamanhã criar.