Faça seu Login para que possamos configurar a navegação de acordo com as suas preferências.
Não está cadastrado?Clique aqui.

BIBLIOTECA

ARQUIVO:
COLEÇÕES
BIBLIOTECA
VIDEOTECA
EXPOSIÇÕES VIRTUAIS
SOCIOAMBIENTAL
A CASA E O MUNDO

ENTREVISTA

FREDERICO DUARTE

Publicado por A CASA em 31 de Julho de 2013
Por Daniel Douek

Diminuir o texto Tamanho da letraAumentar o texto

“O Brasil é a imagem do futuro do mundo”

Frederico Duarte é crítico de design.

O que o levou a estudar o design brasileiro?

Fui fazer meu mestrado na School of Visual Arts, em Nova Iorque. Na primeira reunião, perguntaram: “Você quer fazer sobre o quê?”. Eu respondi: “Quero fazer sobre o Brasil”. Foi uma coisa completamente irrefletida, eu conhecia muito mal o Brasil e senti que era tempo de ver as mudanças sociais e econômicas pelas quais o país estava passando. Queria saber como era ser designer no Brasil, e esse foi o ponto de partida. Depois, fui limitando e entendi que o quê me interessava mesmo era o impacto das mudanças sociais no design.

Ao mesmo tempo em que o Brasil possui enorme riqueza no que se refere à biodiversidade presente em seu território e à variedade de culturas de seu povo, ainda enfrenta problemas econômicos, sociais e ambientais seriíssimos. De que forma essa contradição se manifesta no design do país?

Num país onde a natureza e tão expressiva e tão relevante em termos mundiais, deve-se entender como o design pode servir não para explorar a natureza, mas para trabalhar com a natureza. Não tem só a ver com os materiais em si, enquanto objetos de uso, mas com a forma como eles são cultivados, explorados, processados e distribuídos. Trata-se de pensar o design de fato como um sistema. O Brasil é o quinto maior mercado do mundo. As grandes contribuições que o designer brasileiro pode dar não só ao país, mas, também, ao mundo, tem a ver com essa noção de escala. Quando você faz uma coisa para uma população nacional que é em si, miscigenada, multicultural, uma espécie microcosmo do mundo, e isto é muito interessante. O Brasil é uma espécie de imagem do futuro do mundo: um mundo radicalmente miscigenado, híbrido, bastardo, na forma mais natural do termo. Por outro lado, a desigualdade social é evidente. Existia a ideia de que o design era uma atividade desempenhada de uma elite para uma elite, mas estamos vivendo um momento em que essa imagem pode ser desconstruída. A mobilidade social da chamada “classe C” está mudando radicalmente o país. Precisamos entender o que aquelas pessoas querem, o que elas desejam, e dialogar com eles, não numa forma pedagógica, mas de maneira mercadológica. Será que esse cidadão de classe média baixa quer ter os mesmos usos, os mesmos vícios e os mesmos desejos que a elite ou quer outra coisa? E essa outra coisa, o que é? De que forma os designers podem chamar para si essa missão de oferecer produtos e serviços que ajudem a mudar uma mentalidade?

O design tem uma função social? De que forma o designer pode ser um agente de transformação social?

Para mim, a atividade do designer tem a ver com a resposta a uma pergunta, e não necessariamente com a solução de um problema. Tem a ver com a relação que estabelecemos com o cliente. Hoje em dia, é impossível ignorar a responsabilidade social de qualquer profissão. Mas é importante entender que o designer não controla todo o processo. Os designers podem, sim, tentar procurar clientes que pensem como eles, tentar encontrar condições de trabalho que tenham a ver com a sua posição ética. É a ideia, também, do designer, de fato, como agente social. Isso não quer dizer que os designers se tornem uma espécie de pessoas que só trabalham com a área da cultura ou com a área social. Pequenas mudanças que a Coca-Cola ou o Banco Itaú podem fazer têm um impacto gigantesco, muito mais importante do que fazer uma cadeira de papel reciclado, por exemplo. “Ah, é ecodesign”. Não! Ecodesign é poupar 5% de energia usada em uma agência bancária. Às vezes, porém, os designers optam pela parte mais fácil. Acabam fazendo coisas que são simbolicamente muito fortes e irão expressar essa característica social e não veem onde realmente se pode mudar as coisas.

Como você diferencia os trabalhos em que o design desempenham uma função social daqueles que são socialmente oportunistas? O que é o “fator favela” e de que modo isso se manifesta no design brasileiro?

O fator favela tem a ver com o fato de alguns designers explorarem uma dimensão estereotipada do povo brasileiro, usando esse estereótipo como forma de vender seus produtos – e vender, geralmente, a um público estrangeiro. Pode-se dizer que esse processo teve início com a Cadeira Favela (1991), dos Irmãos Campana. Depois, outros designers e arquitetos têm usado essa “muleta formal”, que, para mim, é muito pouco interessante. O designer Brunno Jahara, por exemplo, tem uma série de mobiliário em que cada peça tem o nome de uma favela brasileira. A pergunta que eu faço é: por quê? Vende mais? Trata-se de uma coisa muito predatória em termos simbólicos. Os designers que fazem isso representam uma elite e contribuem para a perpetuação de um estereótipo.