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Fonte: Termo de Referência Atuação do Sistema SEBRAE no Artesanato


ARTIGO

A RELAÇÃO ENTRE O DESIGN E OS PROGRAMAS DE FOMENTO AO ARTESANATO BRASILEIRO

Publicado por A CASA em 5 de Setembto de 2013
Por Virginia Pereira Cavalcanti e Lucyana Azevedo

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The relationship between the Design and promotion programs of the Brazilian Handicraft


Resumo

O presente trabalho aborda relação do design com a produção artesanal, inserida em um contexto de projeto com apoio ou patrocínio dos órgãos de fomento ao artesanato brasileiro, a partir da análise de documentos, publicações e entrevistas destes Programas: PAB – Programa do Artesanato Brasileiro do Governo Federal, o Termo de Referência Atuação do Sistema SEBRAE no Artesanato, e o Programa de Apoio ao Artesanato Brasileiro da Caixa Econômica Federal. O artigo destaca as orientações das Políticas Públicas atuais e a atuação do Design no planejamento e execução dos projetos, e busca propor novas reflexões sobre essa relação no campo do Design.

Palavras Chave: design; produção artesanal; programas de fomento.


Abstract

This paper reports the relation between design and handicraft production, in the context of the project supported or sponsored by Brazilian handicraft promotion agencies, based on  documents, publications and interviews analysis in the following programs: PAB – Federal Government Program for the Brazilian Handicraft; the SEBRAE System Practice Reference Term in Handicraft and the Caixa Econômica Federal Brazilian Handicraft Support Program. This article highlights public policies, current orientations and the role of Design in planning projects and its execution, and proposes new reflections about this relation over the Design field.

Keywords: design, handicraft, promoting programs



Introdução


Esse artigo é resultado de parte da pesquisa da Dissertação de Mestrado da autora, que tem como objetivo compreender as relações entre os Órgãos de Fomento ao Artesanato e os Grupos de Produção Artesanal no Brasil, por meio do Estudo de Caso da relação entre o grupo produtivo Teares Alegria e o Programa de Apoio ao Artesanato Brasileiro da Caixa Econômica Federal.
Essa parte da pesquisa tem a finalidade de compreender como tem se estabelecido a relação entre o Design, o Artesanato e os Agentes Públicos que determinam Políticas Públicas, financiam e fomentam a produção artesanal. Para isso, vamos buscar traçar o perfil dos seguintes agentes: PAB- MDIC, SEBRAE e Apoio ao artesanato brasileiro- CAIXA CULTURAL.  Definindo o papel dessas instituições e analisando os documentos disponíveis que se referem ao tema Artesanato e Design.
Como Método de Abordagem, foi escolhido o Método Dialético que compreende o mundo como um conjunto de processos interligados, em que “tudo se relaciona” e estão em constante transformação (Lakatos, Marconi). Este método foi escolhido porque a pesquisa é realizada em um cenário dinâmico, envolvendo elementos distintos que se relacionam e se transformam.
Também foi escolhido o Método de Procedimento Histórico que, segundo Marconi e Lakatos, “consiste em investigar acontecimentos, processos e instituições do passado para verificar sua influência na sociedade hoje”. O método foi escolhido para o entendimento das estruturas de produção cultural, design e políticas públicas, para fazer um resgate histórico e conhecer as bases formadoras dessa relação atual.
Como fonte de informação deste capítulo, foram utilizados os documentos disponibilizados pelas próprias representações das organizações que desenvolvem os programas aqui analisados, principalmente em seus web-sites, entrevistas e documentos oficiais.

Programas brasileiros de Fomento à Produção Artesanal

Para entendermos melhor o interesse do Estado Brasileiro em fomentar a produção artesanal é importante ter como ponto de partida que o Artesanato não é somente uma manifestação cultural originária de comunidades e um representante da história da Cultura Material do país.
A partir do conceito proposto pelo Programa do Artesanato Brasileiro do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, em 2010, “Artesanato compreende toda a produção resultante da transformação de matérias-primas, com predominância manual, por indivíduo que detenha o domínio integral de uma ou mais técnicas, aliando criatividade, habilidade e valor cultural (possui valor simbólico e identidade cultural), podendo no processo de sua atividade ocorrer o auxílio limitado de máquinas, ferramentas, artefatos e utensílios.”[1] .
O SEBRAE (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas) desenvolveu uma classificação por tipologias e categorias[2], visando direcionar as ações voltadas para o setor: Artesanato indígena, Artesanato tradicional, Artesanato de referência cultural e Artesanato conceitual.
Segundo a Pesquisa de Informações Básicas Municipais (MUNIC 2006), realizada pelo IBGE em parceria com o Ministério da Cultura, 64,3% dos municípios brasileiros possuem algum tipo de produção artesanal, liderando o percentual das manifestações culturais identificadas na pesquisa. Assim, o setor artesanal também tem grande importância econômica, em um país que possui milhões de artesãos. Além disso, a produção artesanal é fonte de ocupação de uma população de baixa escolaridade e qualificação para o Mercado, evita o êxodo rural como alternativa para fixar o artesão a sua região de origem e tem um papel muito importante em regiões turísticas, com a oferta de produtos que representam e valorizam a cultura local.
No Brasil, encontramos diversos programas direcionados ao apoio financeiro ou estrutural aos grupos de produção artesanal e, a partir da análise de três programas brasileiros que envolvem a produção artesanal, buscamos fundamentar o atual momento desta produção no Brasil, como tem sido vista pelo Estado Brasileiro e quais são as diretrizes de futuro que o Estado pretende para a produção artesanal.

Política, Programa e Projeto

Para compreender melhor como funcionam os processos políticos, da determinação das diretrizes de governo até a aplicação por meio dos projetos, é necessário esclarecer os conceitos de Política, Programa e Projeto.
Política é um conjunto organizado de conceitos, objetivos e orientações das ações relativas a um determinado tema. Orienta as decisões sobre por que, para quem e como articular programas e projetos afins. Consiste em um guia geral de ação e decisões acerca de um tema. Assim, Política Pública é um conjunto organizado de ações correspondentes a uma demanda de interesse público, sob a responsabilidade do Estado.
Uma Política possui vários Programas, que agrupam ações e decisões por áreas. Programa consiste em um conjunto de Projetos e atividades interligadas por objetivos comuns. Mais especificamente, os Programas Sociais são um conjunto ações com o objetivo de resolver um determinado problema, identificado como carência social importante.
Os projetos são conjuntos de atividades inter-relacionadas e coordenadas que permitem operacionalizar programas, especificando todos os fatores e requisitos técnicos, financeiros e organizacionais necessários à sua implantação, com o fim de alcançar os objetivos determinados, com os limites de custo determinados. Assim, os Projetos Sociais tem o objetivo de reduzir ou eliminar as carências sociais. Em casos ligados ao Artesanato e ao Design, as carências sociais estão ligadas também ao econômico, como veremos em seguida, a partir da análise dos Programas de fomento ao Artesanato.

Programa do Artesanato Brasileiro – PAB

O Programa do Artesanato Brasileiro[3] é um dos programas do governo Federal que compõe o Plano Plurianual do Governo Federal desde 2008. Plano Plurianual consiste no conjunto de ações planejadas pelo Governo Federal no início de uma gestão.
As primeiras iniciativas do governo brasileiro ligada ao Artesanato como fonte de e atividade profissional remete à década de 50, a partir de um estudo quantitativo realizado no nordeste brasileiro. Nos anos 60, os estados da Bahia e Ceará foram identificados os maiores índices de artesãos com capacidades produtivas, que comercializavam fora de sua região. Esse estudo revelou a mulher artesã como principal produtora do ramo e responsável pela renda complementar familiar.
Na década de 70 surgiram as primeiras Políticas Públicas voltadas para a promoção do setor e, com a evolução das discussões sobre o tema, as diretrizes que valorizam os aspectos culturais e a organização dos artesãos em cooperativas. Assim, foram estruturados programas de qualificação do artesão e de melhoria da comercialização do produto artesanal.
O PAB foi criado em 1990 e nesta época fazia parte do ministério da Ação Social. Em 1995, o Ministério do Desenvolvimento, indústria e Comércio assumiu a gestão do programa dentro da Secretaria do Desenvolvimento da produção. (Decreto 1.508 de 31 de maio de 1995)
É interessante perceber que, ainda no âmbito da Gestão Pública, dentro do MDIC, o PAB encontra-se sob a coordenação do Departamento de Micro, Pequenas e Médias empresas, com o argumento de “aproveitamento das vocações regionais, a geração de trabalho e renda e apoio ao artesão”. O PAB é responsável pelas Políticas Públicas desenvolvidas pelo Governo em âmbito federal, estadual e municipal, sendo que cada UF do país possui sua Coordenação Estadual.
Em sua página oficial, o Programa apresenta sua Missão e Visão:
 - Missão: “Estabelecer ações conjuntas no sentido de enfrentar os desafios e potencializar as muitas oportunidades existentes para o desenvolvimento do Setor Artesanal, gerando oportunidades de trabalho e renda, bem como estimular o aproveitamento das vocações regionais, levando à preservação das culturas locais e à formação de uma mentalidade empreendedora, por meio da preparação das organizações e de seus artesãos para o mercado competitivo.”.
- Visão: “Induzir e promover políticas públicas em prol do artesanato em todo o território brasileiro e no Exterior, coordenando e desenvolvendo atividades para a valorização do artesão.”.
E apresenta as principais ações que o estruturam: a) Capacitação de artesãos e Multiplicadores; b) Feiras e eventos para a comercialização de Produtos Artesanais; e c) Estruturação produtiva do artesanato Brasileiro. Como o Objetivo de: “Fortalecer a competitividade do produto artesanal para a geração de trabalho e renda e promover seu acesso ao mercado externo.”.
A Capacitação de artesãos e Multiplicadores tem como finalidade a qualificação dos artesãos e multiplicadores, por meio de oficinas de trabalho, palestras, cursos, e ainda a confecção de cartilhas para a formação de artesãos, multiplicadores e técnicos das coordenações estaduais.
A ação "Feiras e eventos para Comercialização de Produtos artesanais" visa o escoamento da produção artesanal e a criação de espaços permanentes para comercialização. Os grupos produtivos podem se inscrever nas coordenações estaduais ou municipais para participar em esquema de rodízio.
Finalmente, a Estruturação produtiva do Artesanato Brasileiro visa fortalecer associações ou cooperativas para a melhoria da gestão de recursos, manejo de material-prima, apresentação e embalagens e comercialização. O programa também apoia projetos de instalação física ou compra de equipamentos.
Em 2006, o Programa iniciou o desenvolvimento do Glossário do Artesanato Brasileiro, uma base conceitual para nortear as políticas, legislação e discussões do setor. O Glossário está estruturado em sete secções: 1) Conceitos Básicos; 2)Tipologias; 3)Classificação; 4)Características; 5) Produtos; 6) Técnicas de Produção Artesanal; 7) Matéria-Prima.
Além do Glossário, o PAB desenvolveu o Sistema de Informações Cadastrais do Artesanato Brasileiro, para cadastrar os artesãos em cada Estado e possibilitar a migração de informações entre eles. A partir deste cadastro, uma das orientações do Governo é regulamentar o artesão no sistema de Previdência Social, e regulamentar as empresas artesanais. Para o PAB, a regulamentação é fundamental pela segurança comercial e riscos operacionais, mas também para cumprir com as obrigações previstas em lei, como a licença da ANVISA – Agencia Nacional de Vigilância Sanitária – e do IBAMA – Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis.
Em 2008, o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate a Fome junto com a Fundação Banco do Brasil desenvolveu o Guia de Geração de Trabalho e Renda que orienta o desenvolvimento de programas e projetos de geração de trabalho e renda no âmbito Federal, segundo esse documento, algumas das diretrizes atuais para Programas de Geração de Renda são:
-    Priorizar empreendimentos coletivos, desde que haja responsabilização.
-    Buscar parcerias no planejamento e execução dos projetos.
-    Minimizar impactos ambientais.
-    Respeitar a legislação ambiental brasileira.
-    Considerar os interesses dos beneficiários.
-    Evitar a pulverização de recursos em numerosos pequenos projetos, ampliando sua escala.
-    Considerar que os empreendimentos de GTR devem atuar no mercado nacional e/ou em nichos de mercado específicos.
-    Considerar que ações complementares no território são necessárias à sustentabilidade dos projetos de GTR.

Termo de Referência – Atuação do Sistema SEBRAE no Artesanato

O SEBRAE, Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas empresas, é uma organização autônoma que visa estimular e desenvolver o empreendedorismo no país. Foi criado em 1972 como uma entidade pública, ligada ao governo federal. A partir de 1990, se desvinculou da gestão pública, tornando-se um serviço autônomo, atuando em todos os Estados brasileiros. Seu principal foco de atuação está no empreendedorismo em diversos segmentos, prestando serviços de qualificação e informação aos micro e pequenos empresários e cooperativos brasileiros.
A missão do SEBRAE é promover a competitividade e o desenvolvimento sustentável das micro e pequenas empresas. As atribuições do SEBRAE nacional em relação ao Artesanato são: Executar as ações nacionais, promover projetos inovadores, desenvolver e testar metodologias para atendimento das necessidades do setor, coletar e disseminar as informações para os SEBRAE|UF (representações locais) coordená-los e apoiá-los, e ainda articular e apoiar ações junto às ações da Gestão Pública. Cada SEBRAE|UF tem a finalidade de formular estratégias de execuções locais, articular parcerias no âmbito estadual e municipal e executar as ações de atendimento do setor em consonância com as diretrizes do SEBRAE nacional.
O SEBRAE atua em consonância com as diretrizes do PAB do Governo Federal expostas anteriormente. O presente termo foi desenvolvido em 2010, como resultado de encontros estaduais que são realizados anualmente pela organização para avaliar suas ações e com a finalidade de “a apresentação de uma base conceitual que facilite o planejamento, a execução e o monitoramento de projetos e ações a partir da definição das categorias artesanais, estratégias e orientações de intervenção e indicadores de desempenho.”.
Segundo o termo, a produção artesanal tem a característica de “ocupar mão de obra sem qualificação formal, onde muitas pessoas buscam um meio alternativo de sobrevivência, especialmente em comunidades com baixo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), dá ao setor um papel estratégico para a diminuição da desigualdade social no país.”. Além disso, com um baixo custo de investimento, a produção artesanal utiliza matéria-prima natural e promove a inserção da mulher e do adolescente em atividades produtivas.
Para o SEBRAE, os principais desafios atuais do setor artesanal são: A falta de arcabouço legal, o acesso aos mercados, a concorrência cada vez maior e a dificuldade do artesão em desenvolver uma postura empreendedora e visualizar o artesanato como negócio.

Programa Caixa de Apoio ao Artesanato Brasileiro

A Caixa Econômica Federal, criada em 1861, é o maior banco público da America latina e o principal agente de políticas públicas do governo federal. É responsável pela coleta e gestão de dados contáveis e gerenciais de todos os órgãos da Federação. Dentro desse contexto, a gestão da Caixa e seus programas estão alinhados com a gestão do Governo Federal.
A Caixa Cultural é a estrutura de marketing paralela à área de negócios e logística da Caixa Econômica Federal, e corresponde à Diretoria de Marketing ligada diretamente à Presidência e às regionais de Comunicação e Marketing, responsável pelas ações de patrocínios, eventos e assessoria de imprensa do banco.
A Caixa Cultural é dividida em três braços principais: o marketing esportivo, de patrocínio e cultural. Possui grandes complexos culturais em seis capitais brasileiras: Brasília, São Paulo, Rio de Janeiro, Curitiba, Recife e Salvador. Como o principal agente de políticas públicas do Governo, uma das orientações atuais para os Programas da Caixa é investir em seus programas de patrocínios, como diz Sílvia França:

“a CAIXA sempre teve essa área cultural e a gente sempre patrocinou tudo que foi possível dentro das leis de incentivo a cultura, tanto pela lei ROUANET quanto as leis municipais. (...) A CAIXA tem muito incentivo na área de patrocínios, (...) E aí sim, a gente segue uma diretriz. A CAIXA é uma empresa pública, portanto, do governo. A gente segue as políticas públicas. Os nossos patrocínios, os nossos incentivos são dentro da política do governo, seja esse governo qual for.” (Silvia França, em entrevista).

O alinhamento de Política (amplo) e Programas (setorial) também fica claro em outra fala de Sílvia França, em entrevista:

“O ultimo Governo Lula, você tinha um direcionamento pra gerar o microcrédito e gerar a inclusão bancária. Os nossos projetos, mesmo os culturais, tem uma orientação pra estar gerando a inclusão bancária. A própria escolha do artesanato foi, claro, uma experiência que deu certo, digo, patrocínios locais de artesanato. Aí se criou o edital nacional, porque a gente viu que era uma linha que você tava estimulando o microcrédito. (...) Então, isso tá dentro da diretriz que a empresa adota na área de marketing. Não é específica do cultural. O cultural faz parte de uma estratégia maior de marketing, que tá sempre aliada ao que determina o Governo Federal.” (Sílvia França, em entrevista)
O Programa de apoio ao Artesanato da Caixa Cultural foi criado em 2003, como o nome Artesanato Brasil com Design, e tinha a finalidade de promover a interação entre artesanato e design, aprimorando a atividade artesanal das comunidades beneficiadas ao agregar novos conceitos às peças produzidas. A finalidade das peças, segundo Tamie Takeda, era a utilização dessas como brindes artesanais em uma ação de relacionamento da CAIXA com clientes. Por isso, se justifica a adequação à preferência estética do presenteado.
Com o amadurecimento do Programa, a partir do lançamento do edital de 2008, para execução em 2009, o Programa passa a se chamar Apoio ao Artesanato Brasileiro com foco no desenvolvimento das comunidades artesãs e de sua sustentabilidade, na valorização do artesanato tradicional, contemplando todo o processo produtivo, desde a aquisição da matéria-prima até a comercialização do produto, a partir do entendimento que essas questões não poderiam ser atendidas com o formato anterior de atuação. Em 2009, o Programa Caixa de Apoio ao Artesanato Brasileiro destinou R$ 550.000,00 a 16 comunidades em todas as regiões do país.
Os objetivos do Programa são: a) Fortalecimento do valor cultural agregado ao artesanato tradicional, desviando o foco do objeto à preparação das pessoas; b) Promoção da autoestima do artesão; c) Compromisso com a sustentabilidade dos artesãos, avaliando as propostas de acordo com a demanda apresentada pela própria comunidade.
Os critérios atuais são: Caráter tradicional do artesanato; Características socioeconômicas das comunidades artesãs a serem beneficiadas; Sustentabilidade do projeto apresentado; Criatividade das soluções propostas para a melhoria da produção das comunidades artesãs.

O Design nos Programas de Apoio ao Artesanato no Brasil

As fontes de informação do PAB não cita o Design especificamente, mas trata da possibilidade de intervenção de áreas do conhecimento na produção artesanal com a finalidade de melhorias, por exemplo, ampliar canais de comercialização, e capacitação de artesãos para o mercado competitivo.
Já o Termo SEBRAE possui um capítulo dedicado à orientação para Intervenção, até porque mais que um Programa, o SEBRAE também é executor de projetos. A intervenção, para o SEBRAE, tem a perspectiva de que: “A lógica de intervenção dos projetos começa e termina no mercado e pressupõe a realização de um conjunto de atividades sequenciais cuja responsabilidade pela execução requer a colaboração de toda a infraestrutura de apoio ao artesanato.”. Segundo o gráfico Termo de Referência Atuação do Sistema SEBRAE no Artesanato (veja a imagem ao lado):

A etapa de Identificação da Demanda abrange pesquisas de mercado, do público (motivações e hábitos de compras, fidelidade a produtos e serviços, nível de gasto, grau de satisfação, entre outros.), da concorrência e uma análise dos produtos mais consumidos, e as limitações encontradas. A orientação do SEBRAE também sugere um olhar prospectivo com estudo de tendências.
A Identificação e Análise da Oferta implicam conhecer os artesãos e seus produtos, sua capacidade produtiva, os diferenciais dos produtos, etc. Essa orientação de atuação dos agentes do SEBRAE visa conhecer a produção artesanal local, identificar a possibilidade de organizações cooperadas e de organização de uma rede de comércio local. Assim como a Análise da Concorrência pretende conhecer produções artesanais em um contexto amplo como, por exemplo, o artesanato latino-americano ou as reproduções industriais de produtos artesanais, até as tipologias do artesanato local.
É na Etapa de Melhoria e Desenvolvimento de Novos Produtos que encontramos a sugestão de colaboração de designers para desenvolver um produto novo, ou atualiza um existente. O Termo ainda diz que: “Conhecido o perfil do público-alvo, a partir da análise da demanda, será possível desenvolver e oferecer um produto coerente com as expectativas de seus consumidores.” O que está em consonância com a ideia de que o processo de intervenção deve partir do mercado, mesmo com a observação que é feita em seguida: “Criar novas linhas de produtos, com uma estética mais despojada e depurada, dirigida ao mercado consumidor de maior poder aquisitivo, pode ser, em algumas situações, uma alternativa para valorizar os produtos e aumentar sua produção, porém sem perder de vista a iconografia, o simbólico e o estético que caracterizam sua cultura de origem.”.
Assim, o desenvolvimento de novos produtos e embalagens não só é uma possibilidade para a atuação do design, mas é uma orientação de intervenção dos projetos a serem executados.
A quinta etapa refere-se à Melhoria e Desenvolvimento de Processos, com a finalidade de tornar a produção mais ágil e competitiva, e pode se dar na substituição ou beneficiamento da matéria-prima, troca de instrumento de trabalho, uso de novas ferramentas, mudança na técnica, na forma, da aparência ou da função, e ainda, no modo de apresentar comercialmente.
Para o SEBRAE, o argumento de que mudanças nos processos e produtos são modos de descaracterizar o trabalho ou afastá-lo de sua pureza original é fruto de uma preocupação ingênua com a cultura popular, defendendo que o artesanato deve ser adequado às mudanças tecnológicas e que não é possível preservar os artesãos das influências do mercado e do meio cultural em contínua mudança. E a necessidade de adotar ferramentas inovadoras se justifica pela exigência do mercado consumidor.
Uma dessas ferramentas é o design, visto como “uma forma efetiva de agregar valor aos produtos e serviços das micro e pequenas empresas.”, e ainda, a indicação geográfica, que, segundo o Termo, tem papel importante em função da tradicionalidade da produção.
A indicação geográfica e seus selos de certificação são as orientações do SEBRAE para a etapa de Agregação de Valor. Na etapa Capacitação, o termo indica que são oferecidos cursos e treinamentos aos artesãos e aos técnicos que atuarão no processo de intervenção com a justificativa que “qualquer mudança em um modo de produção implica uma mudança comportamental daqueles envolvidos nesse processo.”.
Como orientação da etapa Promoção Mercadológica, o termo faz diferenciação entre as estratégias pela conceituação que utiliza, separando as Produções por tipologia (como pode ser visto na tabela ao lado).

Concluindo, a etapa da Comercialização é considerada pelo SEBRAE o maior desafio para o artesanato. A finalidade do direcionamento é promover acesso direto ao consumidor final, eliminando o atravessador, gerando maior renda para o artesão e permitindo contato direto que proporciona troca de informações importantes para adaptação dos produtos aos clientes. Outro direcionamento estratégico de comercialização do SEBRAE é promover redes de comercialização organizadas localmente entre os artesãos, criando estruturas de distribuição em atacado.
Para a Caixa Cultural, a intervenção do design não pode comprometer o valor cultural agregado ao artesanato tradicional em favor de uma estética dominante, das tendências de mercado e da indústria cultural. No que se refere ao design, esse pode contribuir para o aprimoramento do artesanato no que se refere ao seu aspecto funcional, por exemplo, a resistência do material.
O Programa Artesanato Brasil com Design tinha o foco na peça, produto final do artesanato e de seus contextos de criação, e os artesãos eram selecionados para participar do programa por um grupo de especialistas do campo do design, que avaliavam as condições dos produtos e suas adequações aos seus padrões estéticos. Segundo Tamie Takeda: “A intervenção do design era conceitual, não apenas funcional. A preocupação da Caixa com a autoestima do artesão passou pelo entendimento de que a intervenção conceitual do design sobre as peças artesanais reforçava implicitamente o discurso de outra estética, deixando a entender que o artesanato teria seu valor a partir do momento em que fosse “adequado” aos padrões de “bom gosto”.”.
O Programa Artesanato Brasil com Design se preocupava com o escoamento da produção artesanal, adquirindo peças de comunidades artesãs em grande escala, e em promover oficinas de aprimoramento de técnicas de produção. Segundo a avaliação da Caixa, verificou-se que muitas não souberam aplicar os recursos obtidos com a venda das peças e multiplicar os frutos do benefício recebido. Esse resultado justificou a mudança no foco do Programa, buscando criar condições para que o artesão encontre suas próprias necessidades e assim, com a aproximação da comunidade, o Programa tem o objetivo de que os grupos alcancem autogestão apresentando suas próprias demandas, porém, é importante perceber que um edital anual sem premissa de continuidade desconsidera o ritmo de mudanças na produção artesanal. O estágio de autogestão é muito difícil de atingir, como cita Ana Andrade, coordenadora do programa O Imaginário Pernambucano, que, por exemplo, o grupo produtivo que alcançou um estágio satisfatório em autogestão foi formado pelo projeto e tem acompanhamento do projeto O Imaginário por nove anos.
A expectativa atual da Caixa é que o Design proporcione melhor qualidade ao produto final, segundo Sílvia França. Ou seja, que as peças sejam entregues em conformidade com o produto piloto apresentado na inscrição do edital.

Considerações Finais

Finalmente, é interessante notar como a Intervenção de Design, ligada a Projetos patrocinados por Programas de execução das Políticas Públicas, está inevitavelmente ligada às diretrizes do Governo Federal da respectiva gestão, e assim, apoiada, porém limitado por elas.
Ana Andrade deixa isso claro quando diz que a captação de recursos para a execução de seus projetos depende do que está sendo ofertado pelos agentes financiadores, e dos objetivos dos mesmos. Assim, os projetos são adaptados aos editais lançados.
Outro exemplo que pode limitar é a orientação da não pulverização de investimentos, e a priorização pelo investimento inicial em detrimento do investimento constante por um tempo maior que, em um projeto de design, poderia parecer mais coerente. Ou ainda a ideia de que uma grande encomenda acompanhada por um patrocínio proporcione aumento da capacidade produtiva do grupo, desconsiderando a continuidade da produção e a viabilização de comercialização após o período de patrocínio.
É importante enfatizar que o trabalho junto aos grupos de produção artesanal não se trata apenas do produto ou dos processos, a principal mudança deve ser a do comportamento do artesão, e essa é uma mudança progressiva e demorada. Ana Andrade usa a expressão: “as pessoas precisam de tempo pra se apropriar dele (do novo comportamento), querer e acreditar, depois mudar de fato.” E ainda: “muitas vezes as pessoas que financiam querem aquele resultado imediato pra botar no outdoor que fiz que desse certo… e na verdade não é bem assim, é um processo bem demorado, e essa é a maior dificuldade.”.
Podemos perceber que o gráfico apresentado pelo SEBRAE para direcionar as intervenções parte e finda no mercado, característica da visão empreendedora que pretende ser estimulada nos artesãos. Esse mesmo gráfico poderia partir e findar da produção, o que permitiria outra leitura, que prioriza o artesão e a preservação de sua cultura e seus hábitos de vida.
A orientação acerca do Empreendedorismo Social, o estímulo do Microcrédito e do Associativismo, e ainda a regulamentação burocrática (ANVISA, IBAMA, INSS), tem fatores positivos e negativos: A partir desses mecanismos, é possível proporcionar significativas melhorias na condição de trabalho do artesão e garantir direitos, porém, diante das exigências e tributações, pode tornar o trabalho inviável financeiramente.
O Empreendedorismo pode sobrepor a Preservação das Culturas Tradicionais, uma vez que uma das maiores dificuldades está na comunicação e no conflito cultural que se estabelece entre o Patrocinador e o Patrocinado desde o início desta relação. Para Ana Andrade, os editais não são feitos para os artesãos e não há como esperar que o grupo concorra ao patrocínio por ele mesmo. É necessária a presença do intermediário, pois os editais não são inacessíveis aos artesãos, e ainda, que não existe a ideia de planejamento a longo prazo, como diz: “Essa visão de longo prazo não é uma visão recorrente. Essa visão de planejamento a longo prazo é uma visão de outros. O pessoal tá matando um leão por dia é uma coisa muito imediatista.”.

Referências

BONSIEPE, Gui. Design, Cultura e Sociedade. São Paulo, EDGARD BLÜNCHER, 2011.

CANCLINI. Néstor Garcia. Culturas Híbridas: estratégias para entrar e sair da modernidade. São Paulo: EDUSP, 1998.

CARDOSO, Rafael. Uma Introdução à História do Design. São Paulo, BLUNCHER, 2008.

Guia de Geração de Trabalho e Renda: Nova perspectiva na elaboração de políticas, programas e projetos de geração de trabalho e renda. São Paulo, Instituto de Políticas Públicas Florestan Fernandes, 2008.

MARCONI, Marina; LAKATOS, Eva. Fundamentos de Metodologia Científica. São Paulo, Editora ATLAS, 2010.

MORAES, Dijon. Análise do Design Brasileiro, entre mimese e mestiçagem. São Paulo, EDGARD BLÜNCHER, 2006.

Termo de Referência Atuação do Sistema SEBRAE no Artesanato. Brasília, SEBRAE NACIONAL 2010.


Notas:

1 Diário Oficial da União, 06 de outubro de 2010.

2 Fonte: http://www.sebrae.com.br/setor/artesanato/sobre-artesanato/tipologias-e-categorias

3  Fonte: http://www.mdic.gov.br/sitio/