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A CASA E O MUNDO

ENTREVISTA

JAQUES WELTMAN

Publicado por A CASA em 5 de Setembto de 2013
Por Ivan Vieira

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“Fidelização é um dos pontos centrais em qualquer negócio”

Jaques Weltman é fundador e CEO do Airu


Fale um pouco sobre sua trajetória. Você se formou em 2006 em Administração pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), aos 25 anos foi presidente da PETe e agora, aos 29, é fundador e CEO do Airu. Como aconteceu todo esse processo? O que o levou a fundar o Airu?
Eu sempre digo, em brincadeira, que o empreendedorismo está no sangue. O meu primeiro negócio surgiu quando eu só tinha oito anos de idade. Na época eu criei o “Jornal das Crianças” na escola onde eu estudava. Depois disso eu inventei comércio de miçanga, de caneta tinteiro, e fazia até escambo de lanche. Já fiz uma série de coisas.
Então, no fundo, eu acho que esse empreendedorismo está ligado um pouco ao sangue da minha família, do meu avô. Para mim, empreender sempre foi algo nato e que eu gostava.
Portanto, na época da faculdade, eu trabalhei na Endeavor, uma ONG de empreendedorismo. Nessa ONG nós ajudávamos os empreendedores a crescer. Eu vi Cacau Show desde pequenininha, Spoletto, Buscapé e uma série de outros negócios que eram pequenos. Foi nesse ambiente que eu tive contato com os melhores empreendedores do Brasil. Eu vi pessoas como Jorge Paulo Lemann, Humberto Sucupira e Emílio Odebrecht falando sobre seus negócios. Então, eu pensava: “Poxa, também quero ser igual a esses caras”.
Assim, quando eu me formei na faculdade, resolvi entrar na pETe, uma empresa que atua na área da Educação. Porém, antes de entrar na pETe, eu abri uma consultoria na área comercial (já que eu estava focado nessa área), só que eu esqueci que para abrir uma consultoria você precisa ter um pouco mais de história, de background. Então, eu fui começar a trabalhar com uma empresa de tecnologia. E, aí, uma coisa levou a outra. Um dos conselheiros dessa empresa gostou do meu trabalho, me levou para outra empresa e, no final, para resumir uma longa história, esse presidente viabilizou a minha ida para a pETe para atuar como sócio presidente.
No fundo essa é um pouco da linha do que eu gosto de fazer: estar à frente de negócios e possuir independência (confesso que eu tenho um pouco de dificuldade em aceitar hierarquias, processos e rotinas). Esses elementos resumem um pouco do meu perfil. Assim, nesse sentido, é que surgiu o Airu, apoiado pelo grupo Rocket Internet. Na verdade, eu trabalhei no Rocket antes de fundar o Airu. O Airu foi uma iniciativa minha junto com o grupo Rocket e com o Fábio. Na época o Fábio fazia parte da empresa – hoje ele é sócio, mas não está no dia a dia.
E a ideia do Airu é a de empreender com suporte. Eu trabalhei durante quatro anos e meio no pETe empreendendo sem dinheiro, tendo muitas dificuldades. Portanto, eu queria que o meu próximo negócio tivesse estrutura e suporte. Nesse sentido o grupo Rocket é muito bom porque ele me dá condições financeiras e me ajuda a ser um empreendedor melhor. Para o grupo o problema de recurso financeiro é atrelado a mérito. Então, se você entrega resultado, você tem condições de crescer e desenvolver seu plano. Se você não entrega, você é cobrado. Portanto, essa estrutura é muito diferente de uma empresa que está sem recursos. Aqui a capacidade de entrega de resultados é superior a muitas outras coisas. Isso é muito legal.
E junto com essa ideia do suporte, conversando com o grupo, eu e o Fábio tivemos a ideia de fazer algo com impacto. O Fábio também trabalhou na Endeavor e com outras ONGs. Eu já tinha trabalhado com educação também. A partir disso vimos que na internet o que proporciona maior impacto é o mercado, porque existem milhares de empreendedores que podem ganhar dinheiro em cima disso. Então nós pensamos em fazer um mercado (que se chama marketplace). E dentro do marketplace nós pensamos por onde iríamos começar. Assim, tivemos a ideia de começar com artesanato, por ser algo muito presente no Brasil. Hoje nós ampliamos o leque. Agora o Airu não é só um mercado de artesanato. Continua tendo artesanato, mas nos tornamos num mercado de pequenos empreendedores. Abrimos o leque para permitir que pequenos empreendedores também possam vender. Na realidade, o Airu é um mercado de produtos sem marca – se pudéssemos definir dessa forma.

O que te levou a participar de um negócio social? Quais foram os motivos que te direcionaram para essa área?
Na verdade, o principal motivo foi fazer algo que tivesse impacto social. O Airu funciona como um meio que me permite unir o empreendedorismo (que faz parte do meu perfil) com a ideia de construir um impacto positivo.
Quando eu vejo que hoje o Airu tem quinze mil lojas – sendo que grande parte delas estão ativas e que pelo menos 50% desses estabelecimentos já venderam no mínimo uma vez na história do Airu – percebo que esse é um processo no qual você pode gerar renda para essas pessoas. É comprovado que o Airu gera renda para muitas pessoas. Umas mais, outras menos. Mas nós, de qualquer forma, fazemos parte da complementação da renda familiar. Grande parte dos nossos vendedores são mulheres, com seus filhos em casa, que trabalham do seu próprio domicílio para ajudar a família.  Portanto, o que me levou a trabalhar no Airu está ligado à linha de ter um negócio, de ser empreendedor, somado a uma necessidade de gerar impacto perante a sociedade, dando retorno financeiro para essas pessoas.

O que é o Airu? Como funciona a metodologia utilizada pela empresa?
O Airu é um mercado, como qualquer outro. Não é diferente de qualquer site de venda online ou shopping. Então, basicamente, temos os lojistas – reunidos numa plataforma virtual – e temos os compradores. O Airu traz clientes para vender nessas lojas e nós ganhamos uma comissão de quinze por cento por cada venda feita no site. Nesses quinze por cento do valor do produto já está inserido todos os custos: meios de pagamento, segurança, entre outros. Então, o lojista tem uma plataforma para vender os seus produtos de forma segura e o comprador tem uma ampla variedade de produtos para escolher e comprar de qualquer vendedor. Também contamos com o recurso de aceitar todos os meios de pagamento e de calcular o frete automaticamente. Portanto, comprar ou vender no Airu é muito cômodo para todos. E se acontecer de alguma das exigências do código de defesa do consumidor não ser cumprida, o Airu entra como intermediário para solucionar o problema.

O que significa a palavra “Airu”?
Airu é um pássaro, em tupi-guarani. Nós quisemos pegar uma palavra curta e que remetesse ao Brasil. Assim, pegamos um dicionário de tupi-guarani num determinado dia e resolvemos decidir qual seria o nome. E, aí, olhamos Airu: gostamos da palavra e acabou ficando desse jeito.

O que é necessário para um artesão abrir uma loja virtual?
Não é preciso muita coisa, na verdade. O artesão precisa ter um cadastro no Airu, mas não é necessário ter empresa aberta. É importante que as notas fiscais dos produtos sejam emitidas, mas hoje em dia já é possível fazer isso como empreendedor individual. E a pessoa precisa ter um cadastro no nosso meio de pagamento, o Moip, que faz a gestão dos recursos. No fundo, o Airu é o intermediário comercial e o Moip é o intermediário financeiro.
E para colocar o seu produto nos anúncios do site é preciso ter boas fotos, um bom preço e um bom descritivo. Mas isso é nato de qualquer loja virtual: ter um bom descritivo do produto, possuir uma classificação correta do produto (para ser achado facilmente) e ter as dimensões e o peso do produto informado corretamente para o cálculo do frete.
Agora, para o Airu, a maior exigência é que o lojista cumpra com o que ele combinou. Se uma loja respeita os prazos de entrega, a pessoa recebe seu dinheiro sem nenhum problema e o Airu continua expondo os produtos. Entretanto, se o lojista não entrega, se aparecem muitas reclamações, se a pessoa não responde ao seu cliente e não organiza o seu próprio negócio, o Airu não tem intenção de continuar o relacionamento.

Então, o vendedor recebe o valor só depois que a entrega é efetuada?
Não. Após a venda o lojista recebe o valor em até catorze ou quinze dias se o pagamento foi via cartão ou em até dois dias se o pagamento for feito por boleto bancário. Entretanto, existe um processo de credenciamento desse fornecedor: se ele não efetua a entrega dos produtos nós começamos a restringir algumas coisas dentro do Airu, podendo chegar, inclusive, ao cancelamento da loja.

Atualmente, quantos artesãos estão cadastrados no Airu?
Hoje são quinze mil lojistas. Desses quinze mil lojistas, uma parte deles são artesãos. Eu não consigo te precisar quantos, mas eu posso afirmar que é mais da metade. Desses quinze mil lojistas nem todos estão vendendo, mas é o fluxo normal: alguns tiram férias, outros organizam seu próprio negócio, outros param. Posso classificar esses quinze mil como lojas cadastradas. E, naturalmente, temos uma queda das lojas ativas por causa de uma série de problemas: a pessoa desiste de vender, ou está organizando seu próprio negócio, ou ficou doente, ou está de férias, entre outras questões.

De acordo com o site de vocês, o propósito da empresa é “conectar produtores diretamente com consumidores e resgatar um comércio humano, feito por pessoas e para pessoas. Acreditar no valor do trabalho manual e da produção com autoria: produtos únicos, com história e identidade, dão mais significado ao que consumimos”. Esse objetivo é contemplado? Como vocês avaliam os resultados alcançados?
Acho que, em parte, sim. Nós sempre tivemos um esforço muito grande para alcançar esse objetivo. O Airu se posiciona como um facilitador e, como tal, cumpre com essas demandas e esses objetivos tranquilamente. Contudo, o que falta é uma necessidade do mercado valorizar essas ações. Se, por um lado, nós proporcionamos o comércio humano, o trabalho com autoria e o empreendedorismo, ainda falta no Brasil, eu acho, a valorização desse trabalho.
Eu posso anunciar um produto mas, para manter o negócio, o meu consumidor precisa comprar. E ele tem que comprar um produto artesanal buscando o valor presente naquele objeto. Quando eu falo valor me refiro a olhar o preço do produto e achar aquele valor justo. Quando o consumidor entra num supermercado, num shopping ou numa loja de eletrônicos ele vê uma televisão de R$4.000,00 e não se preocupa em pagar esse valor por aquele produto. Entretanto, quando ele vê um produto entalhado em madeira que custa R$1.000,00 ele acha um absurdo, não é?
Assim, a questão está em como entender o valor daquele objeto. Com certeza aquela TV foi feita num tempo muito menor do que a peça de madeira, mas o valor desse último produto é muito diferente. Portanto, há uma questão cultural nesse segmento que é difícil de resolver e, na minha visão, não é o Airu que vai conseguir solucionar esse problema. O que o Airu faz é proporcionar ao consumidor uma vasta quantidade de produtos (que se enquadrem no segmento de moda, decoração, produtos infantil e bebê, ocasiões especiais) de pequenos empreendedores. Entretanto, fica a cargo do consumidor, normalmente, a escolha do que e onde comprar.

No seminário de A CASA, você chegou a destacar a importância de uma estratégia de marketing bem elaborada, afinal, “quanto mais longe [do produto], mais inseguro está o consumidor” (já que as vendas acontecem pela internet). Em sua opinião, os resultados obtidos pelo Airu, até agora, são reflexos de uma boa estratégia de marketing?
Cem por cento. Eu tenho certeza absoluta que os resultados alcançados são por causa do investimento em marketing. Na minha visão, a vantagem e o diferencial do Grupo Rocket é o marketing. Eu posso dizer que, de todo o mundo, esse é um dos grupos que mais investe nessa área. O Rocket, por exemplo, é o grupo que mais vende no Brasil através de divulgações pelo Facebook.
No dia do seminário o que eu destaquei é que as pessoas subestimam a dificuldade do mercado de internet e acreditam que sozinhas elas conseguem vender. Eu participei de um congresso em outro dia e vou dar um exemplo muito claro: uma empresa de sapatos que começou como uma loja na rua, de repente, fechou uma parceria com o Mercado Livre, começou a vender seus produtos nesse site, cresceu, fez uma parceria com o Submarino, cuidou de toda a operação de sapatos dessa loja virtual e, algum tempo depois, virou a Netshoes. Então, a Netshoes não começou como a Netshoes. Ela começou como uma loja de rua. As pessoas não se lembram desse caminho que foi percorrido. Elas acham que vão abrir uma loja e que ela vai crescer de forma muito rápida. Não existe essa possibilidade se você estiver trabalhando sozinho.
No caso do Airu, eu sempre incentivo o micro empreendedor a ter lojas em todos os lugares. Quanto mais lojas ele tiver, melhor. Assim como existe Lojas Americanas em quase todos os shoppings e existe Vila Romana e Aramis em vários locais, o pequeno lojista precisa pensar que o seu negócio também deve estar em todos os shoppings e em todos os lugares. Afinal, quanto maior a sua presença no mercado, mais exposto a sua marca e o seu produto estão.
Não existe uma lógica de você ter um site próprio sem investimento em marketing porque vai ser como se você não tivesse nada, vai ser igual a ter uma loja fechada ou uma loja num ponto ruim, onde não passa ninguém. As pessoas confundem a ideia de que ter uma loja na internet é que nem ter uma loja física, que você abre num ponto e espera o cliente vir. Na internet não existe isso. Você tem que trazer o cliente. Ele não vai vir porque ele quer. Tirando sua mãe, seu pai, seu tio e sua amiga que vão entrar no site e comprar o primeiro produto por dó, com o seu cliente não vai ser assim. E é isso o que eu tento falar para as pessoas.
O Airu ainda tem um longo caminho pela frente (assim como todo mundo tem). E eu também quero que uma loja aqui do Airu, num determinado dia, me ligue dizendo: “Olha, eu estou muito grande para o seu site. Ou você cria alguma coisa especial para mim ou terei que expandir meu negócio para outros locais.” Eu ficaria muito feliz.

No seminário de A CASA você também falou do atendimento ao cliente (da relação entre fornecedor, empresa e consumidor). Em sua opinião, o que é necessário para ter um bom atendimento?
Fornecer o máximo de informações possíveis e ter prontidão na resposta. Se você não tiver essas duas coisas o negócio não funciona. Na internet as pessoas são muito mais corajosas e exigentes por causa da cultura não virtual que o brasileiro ainda tem.
Se você pensar nos Estados Unidos, todo mundo faz compras pelo celular ou pelo computador e eles se sentem seguros agindo dessa forma. Entretanto, aqui no Brasil, ainda existe uma insegurança muito grande. As pessoas tem medo de colocar as informações do cartão de crédito porque não confiam no site. Existem sites que, de fato, não são confiáveis. Mas nós temos que nos acostumar com esse mercado – e isso leva tempo. Se a gente for pensar o Brasil hoje, em termos de internet, nós somos apenas um décimo do que é os Estados Unidos. Ainda temos um longo caminho pela frente.
E aqui está presente muito essa questão do medo. Dado que ele existe entre os nossos consumidores, como podemos combatê-lo? O medo, em geral, é a dificuldade de enxergar o que vem a frente. Eu tenho medo de algo que eu não conheço: desde o medo do escuro, até o medo de avião. As pessoas tem medo do que vai acontecer, do futuro. E a única maneira de matar esse medo é oferecer o máximo de relacionamento possível. Então, por exemplo, é preciso ter um bom descritivo do produto, apresentar as suas dimensões, ter uma bela foto e quando o cliente fizer uma pergunta, dar a resposta em menos de vinte e quatro horas. Na minha visão, são serviços como esse que fazem com que o consumidor adquira uma segurança no processo. Todos esses fatores são importantes para um bom serviço na internet.
E é isso o que o Airu faz. Nós tentamos dar o máximo de informação possível para o nosso lojista e para o nosso consumidor. E é por esse meio que o negócio pode alcançar sucesso. Se você não atende bem o seu cliente, a sua empresa não cresce.
O negócio via internet só consegue se manter através da recompra porque o investimento para trazer um cliente é muito alto. O consumidor está exposto a muitas lojas ao mesmo tempo. Diferente de um shopping, onde o que você quer comprar está limitado ao número de lojas físicas do estabelecimento, na internet você tem todas as opções. Então, ou o site oferece um bom serviço e se posiciona como uma empresa de qualidade, ou o cliente vai procurar os meios de reclamação, as avaliações e não vai comprar com você. Ou, se ele já comprou no seu site, não vai fazer a recompra porque teve uma experiência ruim. E esse é um problema que nós enfrentamos na internet como um todo.

Esse medo, que você mencionou, também está relacionado à distância do consumidor em relação ao produto?

Claro. A coragem do consumidor e a distância em relação ao produto são grandezas diretamente proporcionais. Portanto, quanto maior a distância, maior a coragem e maiores serão as reclamações. O cliente, por e-mail, é super agressivo. Pelo telefone ele já é mais tranquilo e fala que compreende o seu lado. E, pessoalmente, o cliente é um amor. No e-mail, no Reclame Aqui ou no Facebook a pessoa fala o que quiser porque ninguém está validando. Mas, se eu ligo ou falo pessoalmente com esse cliente, dizendo que entendo o lado dele e pedindo desculpas, ele até deixa de reclamar. Nesse caso, a questão segue a linha do cliente perceber que eu sei que ele existe e que eu me importo com ele. E a maneira de matar essa distância é dar a informação que ele precisa.

O formato de vendas de produtos artesanais pela internet já é bem utilizado em outros países. Temos, por exemplo, a DaWanda (com sede na Alemanha), a Ezebee (na Suíça), a Etsy (sediada no Estados Unidos), o próprio Elo 7, aqui no Brasil, e uma série de outras empresas. Dentro desse universo de muitas empresas, qual é o diferencial do Airu?
Eu acho que, aqui no Brasil, o Airu tem um diferencial muito grande porque ele é o precursor de uma série de ferramentas.
Desse leque de empresas que atuam aqui no Brasil, o Airu foi o primeiro a fazer o modelo de comissionamento, exigindo que o lojista valorizasse o consumidor aceitando todos os meios de pagamento e colocando o frete. O Airu foi o primeiro a lançar a ferramenta de atacado. Então, eu vejo o Airu como um precursor aqui no Brasil. Eu acho que esse é o nosso grande diferencial. Pensando no mercado em si, nessas inovações, foi o Airu que puxou tudo isso. Todo mundo, atualmente, cobra comissionamento dos lojistas, calcula o frete automaticamente e aceita todas as formas de pagamento por causa do Airu. O Airu tem puxado e agitado esse mercado que estava muito acomodado. Então, se for pensar no Brasil, esse é o grande diferencial.
Um pouco além no Brasil, o nosso diferencial segue a ideia de ampliar o escopo do artesanato e abrir os olhos para o micro empreendedor. Na nossa visão, a angústia de um artesão é a mesma angústia de um pequeno empreendedor (que não necessariamente faz o produto na mão). No Airu, ambos possuem a necessidade de selecionar o produto, pensar como confeccioná-lo, fazer a sua curadoria, tirar a foto e esperar a venda para, assim, conseguir ter uma renda para pagar as suas contas. Então, a necessidade é a mesma. Por isso nós acabamos ampliando um pouco mais o leque. Esse é um dos nossos diferenciais com relação a cultura dos outros mercados. Existe uma cultura norte americana do “faça você mesmo”, muito mais forte que aqui. O Etsy é muito forte nessa cultura. Na Europa é um pouco parecido, mas ainda tem a questão que o produto é mais seriado. Existe o “faça você mesmo”, mas também há uma pequena organização, uma produção mais organizada, com uma estrutura mais “industrial”. E no Brasil temos um modelo meio híbrido porque, na minha visão, o artesanato tem que passar por uma mudança de qualidade. Acho que existem poucos artesãos que conseguem ter uma estrutura de negócio bem feita, que vai da qualidade do produto, do preço certo até o atendimento ao cliente.
E isso é muito diferente no exterior. A qualidade da foto dos produtos do Etsy e de outros sites da Europa é estupidamente superior. Os artesãos contrataram um fotógrafo? Não. Eles nem se preocuparam com isso. Eles simplesmente pegaram um celular com câmera de boa qualidade, ou pediram a ajuda de alguém e fizeram um trabalho decente, afinal eles estão preocupados com o consumidor. Aqui na Airu, e no Brasil como um todo, é muito difícil você convencer um artesão de que a qualidade da foto é importante. Além disso, é muito complicado explicar que ele tem que responder as mensagens dos consumidores. Então, na verdade, você tem uma cultura no Brasil que precisa ser quebrada. E o Airu tende a ser o precursor dessas necessidades. Eu acho que a grande diferença do Airu (com relação à concorrência) é a valorização do consumidor. Um shopping só existe porque tem gente comprando. O artesão precisa entender que, por mais original e único que o produto dele seja, ele precisa se ajustar às competições atuais e se organizar, porque senão a televisão de R$4.000,00 vai continuar sendo mais importante que a madeira talhada de R$1.000,00. Essa é a questão.

Em sua opinião, o que um produto precisa para ter sucesso?
Preço, acabamento, descritivo, foto, tudo! Eu acho que é isso. Tem que estar bem embalado, com uma cartinha bem feita dizendo “olha, eu fiz para você”. Precisa ter um belo acabamento. A foto tem que mostrar o detalhe do produto.
Outra coisa importante é colocar o descritivo. Na loja física tem o vendedor que fala para você “esse é um produto talhado por índios aborígenes de um determinado lugar, que demorou dois meses e meio embaixo da terra para poder pegar essa cor”. O vendedor, nesse caso, agrega valor ao produto. Mas na internet, se você não descrever esse processo (de forma resumida), não existirá esse valor. Sem essa descrição o consumidor vai olhar a madeira talhada de R$1.000,00 e achar muito caro, porque antes ele viu uma série de produtos parecidos com um preço muito menor (mas que não carregam a mesma história). O artesanato não tem comparativo. Você não consegue compará-lo. Então, quando isso ocorre, você não tem como saber se o produto é caro ou barato ao menos que você, de fato, prove o valor. Não o preço, mas o valor. E o valor, na internet, é uma concepção que não é apreensível de forma direta porque não existe o contato entre as pessoas. Portanto, o valor deve ser passado através de imagens do artesão trabalhando, contando a sua história e adquirindo, por si só, a sua renda e o seu respeito. Isso é importante.

Quando falamos na produção do objeto artesanal, vemos que inúmeros artesãos e instituições do segundo e terceiro setor encontram muitas dificuldades para a comercialização dos produtos. O Airu, entretanto, com 1 ano e 9 meses de existência, já tem 538 mil curtidas no Facebook, possui mais de 100 mil produtos cadastrados, já apareceu na mídia com artigos no Valor Econômico, Forbes Brasil, Catraca Livre, Brasil Econômico e O Estado de São Paulo, e, segundo a Startups, a empresa mantém um crescimento mensal de 30% e recebeu um investimento adicional de 2,5 milhões de dólares da Rocket Internet. Tem isso em vista, como é possível ser grande em um mercado caracterizado por dificuldades na comercialização e por ter produção, na maioria dos casos, de baixa escala?

De fato, é a variedade. Hoje o Airu tem quinze mil lojas e quase duzentos mil produtos cadastrados. Então, a probabilidade de efetuar uma venda é muito maior. E quem não se ajusta ao site não vende porque só ganha destaque quem entrega e apresenta qualidade nos seus produtos. E tem um dado interessante que, nos Estados Unidos, cerca de noventa por cento do comércio do Etsy é feito por empreendedores que ficam nas suas próprias casas. No Brasil acontece a mesma coisa com o artesanato. Então, ou os clientes vão à casa da pessoa para comprar o produto ou o artesão pode usar a internet para comercializar.
E no Brasil nós temos que parar de imaginar que ONG e artesanato são atividades dos menos favorecidos. ONG precisa ser boa, organizada e tem que crescer. O mesmo acontece com o produto artesanal: precisa ser bom, bem acabado e tem que vender. Não pode existir a ideia de que as pessoas compram o produto porque o artesão faz parte de uma ONG. A pessoa precisa comprar porque o produto é bom.
O artesão pode fazer parte de uma ONG, mas o produto dele também tem que ser bom, bem acabado e que não estrague um dia depois da compra. É um produto diferente, customizado e que deve ter um preço adequado. Não é por ser uma ONG que ela pode vender um guardanapo colorido por R$10,00, por exemplo. Se o pacote de guardanapo é R$0,50 eu posso vender o meu produto a R$1,00 ou R$2,00, mas eu preciso agregar o valor necessário para que isso aconteça (ao menos que exista claramente um valor percebido ali).
Então, é necessário mudar um pouco essa cultura. A ideia aqui é que é um negócio (como todo negócio) tem que crescer, gerar resultado e gerar renda. Se eu não gero renda para o meu lojista, ele acaba brigando comigo. Agora, da mesma forma, se o lojista não consegue atrair e trazer o cliente, eu não tenho o que fazer.
Eu trabalhei na Endeavor e quando eu comecei lá tinham dez pessoas. Agora já tem quarenta. Portanto, a ONG cresceu, faz parcerias. E como é que o Airu consegue fazer isso? Porque nós temos uma variedade ampla de empreendedores com negócios muito bons. Por exemplo, existem empreendedores aqui do Airu que tiram R$3.000,00 ou R$5.000,00 por mês porque eles fazem o trabalho da forma correta. É preciso entender que o artesão faz parte do ambiente do empreendedorismo.
Se eu pego o artesanato, por mais que ele possa ter relações culturais e sociais, não é muito diferente do pequeno empreendedor que faz uma roupa de moda ou que compra produtos e cria a sua própria marca. Todos eles têm os mesmos problemas. Se você não estiver na moda, na tendência, você não vai se desenvolver. Não adianta vender produtos infantis do Toy Story se agora a moda é o Meu Malvado Favorito. Não é porque você é uma ONG que eu vou comprar o Toy Story. O meu filho, agora, quer o Meu Malvado Favorito porque ele está na moda. Então, ou você se organiza e se antecipa ou você não vai vender. Acho que essa é uma discussão muito importante. E a Airu faz isso. Nós somos um mercado e, por isso, disponibilizamos e proporcionamos produtos para todos os tipos de consumidores.
Outra inovação do Airu foi o ranqueamento de produtos. É um processo automático em que você não paga para ter destaque (como acontece na concorrência). No Airu, se você entra e cresce, seu produto vai aparecendo nas colocações de acordo com as compras dos clientes. Se o cliente compra, clica e olha o produto, a minha ferramenta automaticamente coloca-o lá em cima no ranking. E se você olhar a primeira página de qualquer categoria, os que aparecem são os mais vendidos, os mais procurados, os mais cobiçados e os mais clicados, porque estão lá por mérito. É um ranking que expressa o que o meu consumidor está falando.

Em sua opinião, o principal problema do Brasil no momento de comercializar o produto artesanal é a falta de uma visão empreendedora?
Sim. Concordo cem por cento. Eu não consigo ver esse problema de forma diferente. É necessário mudar essa cultura do paternalismo do estado que vem desde a época do Vargas. Eu acho que um pouco da ideia dessa mudança é nós nos questionarmos mais. As pessoas têm que parar com essa linha do “Por favor, me ajude”.

Concordo com o que você disse: tem que ser empreendedor.

Por isso o desafio é tão grande. Se olharmos alguns números do nosso país, vemos que o Brasil é o terceiro país mais empreendedor do mundo, segundo o Global Entrepreneurship Monitor (GEM). Mas se você olhar atentamente vai ver que mais de cinquenta por cento desse empreendedorismo é de necessidade, e não de oportunidade. É o caso da pessoa que ficou desempregada e abriu uma barraquinha de cachorro quente. Não é o indivíduo que viu uma oportunidade, que visualizou um nicho de mercado. Portanto, nós temos poucos empreendedores nesse formato. E a Endeavor, na minha época, atuava nesse segmento, estimulando as pessoas a serem empreendedoras, a procurarem o SEBRAE ou alguma outra instituição que ajudasse no desenvolvimento dos negócios.

O que poderia ser destacado como a principal dificuldade de trabalho do Airu?
Eu acho que é a fidelidade é uma questão difícil atualmente. Como é que você fideliza o cliente-lojista e o cliente-consumidor? É um pouco do meu trabalho aqui como CEO, como responsável pelo Airu. O meu trabalho aqui é fidelizar o meu lojista, fidelizar o meu consumidor. E fidelizar passa por todo um processo que é longo e trabalhoso.. O meu lojista se fideliza quando tem uma boa experiência de venda. O meu consumidor se fideliza quando tem uma boa experiência de compra. Portanto, eu preciso utilizar e criar todas as ferramentas possíveis para isso acontecer. Eu acho que fidelização é um dos pontos centrais em qualquer negócio.
E nós estamos focados nisso. Então, se um lojista proporciona uma experiência de venda ruim, ele não vende mais no Airu. Estamos sendo cada vez mais restritivos nesse aspecto. O consumidor que tem uma experiência ruim no Airu tem que ser retomado, precisa de um cuidado e atenção especial. Eu acho que essa é a grande dificuldade (que passa, inclusive, por tudo o que eu falei nessa entrevista). Se você não tiver um bom serviço, se você não atender bem, se você não tiver bons produtos, você não tem fidelidade. E, assim, você não tem um mercado e não vende os seus produtos.