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A CASA E O MUNDO

ENTREVISTA

ETEL CARMONA

Publicado por A CASA em 9 de Dezembro de 2013
Por Ivan Vieira

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“Hoje, a madeira é tão preciosa quanto o ouro ou o diamante”

Etel Carmona é designer e fundadora da ETEL Interiores


Fale um pouco sobre sua trajetória. Nascida no sul de Minas Gerais, você começou a trabalhar com a arte moveleira quando se mudou para um sítio em Louveira, no interior de São Paulo, e em 1988 fundou a ETEL Interiores, na cidade de Valinhos. Como aconteceu todo esse processo?

É uma história singular, porque eu não fiz arquitetura nem desenho industrial. Eu fiz História da Arte, estudei muito a história da arte. O que me levou a trabalhar com a marcenaria foi a arte. De tudo o que eu estudei, de tudo o que eu pesquisava em viagens, sempre o que me encantava era a arte. Dessa forma, eu fui descobrindo a arte na movelaria, no design, na construção de uma peça, de uma cadeira, de uma credencia, de uma mesa. No início, em 1984, eu comecei restaurando peças de época na garagem do meu sítio. Para isso, eu pesquisava em antiquários qual era o local e a época de origem daquela peça. Assim, comecei a descobrir muitas coisas interessantes sobre esses objetos. E, para ajudar, tudo acabou começando como um trabalho social, com um marceneiro que tinha construído a minha casa. Como eu sou mais de ensinar a pescar do que a dar o peixe, quando ele começou a me pedir dinheiro emprestado eu disse: “Não, você me ajuda a restaurar os móveis que eu divido as coisas com você”. E, assim, uma sucessão de acontecimentos foi se desenrolando.

Comecei a trabalhar muito com o Fúlvio Nanni na década de 1980. Aliás, o Fúlvio foi meu grande padrinho, meu grande abridor de portas aqui em São Paulo. Ele me escondeu por dois anos; não falava para ninguém quem estava fazendo as coisas para ele. A primeira pessoa para quem ele contou foi a Cláudia Moreira Salles, e após esse episódio nós começamos a trabalhar juntas. Na época em que eu montei a loja na Virgílio, na Vila Madalena, só tinha o Carlos Motta. Quando eu abri essa loja a minha intenção era inaugurar um ambiente que representasse a força de tudo o que eu tinha na minha essência. Para mim, todo negócio ou toda ação que você faz na vida deve ser acompanhada de uma essência, pois é ela que vai te segurar e te dar um norte. Eu sempre fui uma pessoa muito obcecada, muito determinada, portanto sempre procurei agir de acordo com a minha essência.

Na época, para encontrar alguém que me ajudasse, eu fui até o Liceu de Artes e Ofícios, porque tinha que existir alguém que fizesse aquela arte que eu estudava, pesquisava e encontrava em peças de época. Depois de um determinado período eu encontrei um mestre, o Moacir, que está comigo até hoje, há 30 anos. Ele é uma pessoa maravilhosa. Ele me ajudou muito com cinco meninos que estavam comigo lá no sítio de Louveira. Eles moravam lá numa casa que eu tinha no sítio. Era uma coisa bem interessante. O Moacir, no início, vinha para o sítio todos os sábados, mas teve um momento em que não dava mais para ele vir só um dia da semana, porque os negócios começaram a crescer muito. Todo o trabalho fazia parte de um processo muito singular, ímpar, que fugia do habitual. Eu, pensando em elementos da alta-costura, virava o móvel do avesso, trabalhando tudo no encaixe. Sobre esse meu modo de trabalhar, o Moacir dizia: “Dona, lá dentro da gaveta não precisa, ninguém vai ver”, e eu respondia “Mas eu vejo, eu sei como está todo o interior do móvel”.

A ETEL é centrada no conceito da alta-costura. Se você virar um dos nossos móveis do avesso, verá que é perfeito. Desse modo, o negócio explodiu. Quando eu montei a loja, a fábrica já existia há 7 anos. Num determinado dia, entrou na loja um intelectual carioca que ficou fascinado com o que viu. Eu nunca ficava na loja, mas naquele dia, excepcionalmente, eu estava lá e fui atendê-lo. Ele dizia: “Nossa, que impressionante. É de família? Tem tradição?”. Eu disse: “Não, mas tem uma história por trás de tudo. O senhor quer ouvir?”. Ele me respondeu: “Não, não precisa contar. Mas há quanto tempo você faz isso?”. Eu, achando que sete anos era um tempão, falei isso para ele. Muito surpreso, ele respondeu “Sete anos?! Não quero ouvir sua história, porque é impossível que em sete anos alguém consiga fazer isso”.

Sempre digo que a história da minha vida está escrita nas estrelas. Quando eu conheci o Jorge Zalszupin – que tem uma trajetória de vida muito forte, sendo refugiado de guerra, inclusive – ele me disse que a vida dele era uma sucessão de milagres e que eu era mais um deles. Então, toda a minha trajetória sempre foi meio lúdica, meio mágica, até mesmo com o meu envolvimento com a natureza. Eu sempre amei o verde, a lua, a natureza de forma geral, tanto que já fui levada para a Amazônia. A ETEL também foi a primeira movelaria no Brasil a ser certificada pelo Forest Stewardship Council (FSC), por conta do nosso uso responsável da madeira.

Em resumo, gosto de dizer que tive uma trajetória sempre orientada por uma essência muito forte, desde o início. Para mim, a ETEL tem o ambiental, o social e o econômico. E não digo isso porque a sustentabilidade está em moda hoje em dia. Desde o início, comecei trabalhando com o social, com o econômico e valorizando a madeira. Na época só se usava mogno, ninguém conhecia ou trabalhava com outras espécies. Eu, em contrapartida, entrei nesse ramo utilizando uma diversidade de outras espécies. Somente depois é que veio o FSC, com a proposta de usar a diversidade da floresta. E, ao meu ver, essa é uma ação muito positiva, porque no Brasil nós temos muitas espécies diferentes de madeira, como  timbaúba, muirapiranga, freijó, sucupira, maru e tauari branco, por exemplo. Assim, com essa diversidade de madeiras, podemos testá-las para ver qual pode ser usada em movelaria – afinal, não são todos os tipos que são bons para se fazer uma peça, um móvel ou uma cadeira.

Nessa sequência de eventos, o Fúlvio abriu para a Claudia, e depois disso os negócios só se ampliaram. O Fúlvio começou a liberar e eu fiz um trabalho com o Ucho Carvalho também, na Formatex que ficava na Oscar Freire, mas, hoje em dia, nem existe mais. Quando eu abri a loja em 1993, há vinte anos, aí a iniciativa foi para o mundo, porque o trabalho que a gente desenvolveu se tornou um diferencial no mercado. Ganhamos até um prêmio em Londres com uma peça do Isay Weinfeld, pelo desenho, construção e por trabalhar com o conceito de sustentabilidade.

Em sua opinião, quais foram as características da arte moveleira que mais contribuíram para que você se interessasse por essa área?

O que mais me encanta na arte da marcenaria são os encaixes e o acabamento. Quando você vê uma peça pronta, você não sabe a arte que está por trás daquele objeto. É tudo feito à mão, no formão, de modo artesanal. Desse modo, eu falo que aqui você não compra uma cadeira, mas você compra uma escultura. Você compra uma peça ou um móvel, abre a gaveta e vê aqueles cabos de andorinha, aqueles encaixes. Isso, para mim, é arte: os movimentos que a gente consegue fazer com a madeira.

Nesse mesmo sentido, o acabamento também é algo que me interessa muito. Cada madeira e cada artesão possuem a sua própria personalidade. Assim, a face e a característica de cada artesão ficam marcadas na peça que ele produz. É como um pintor que deixa as suas pinceladas: cada um tem uma técnica própria. Cada artesão também carrega isso nas peças que ele faz. Ao vermos duas cadeiras do mesmo estilo feitas por artesãos diferentes, sentimos a pincelada de um e a pincelada do outro.

Muitos dizem que a sua filosofia de trabalho é tratar a madeira como se fosse uma joia, a madeira brasileira especificamente. Como isso ocorre? Qual a importância de se ter um cuidado tão especial com a madeira?

Hoje, a madeira é tão preciosa quanto um ouro ou um diamante por causa da devastação que o homem está fazendo na natureza. Se continuarmos do jeito que estamos, daqui a pouco a madeira não existirá mais. A Amazônia é a maior floresta tropical do mundo e, se nós humanos a destruirmos, sofreremos grandes consequências. Hoje em dia nós já estamos assistindo e vivenciando as mudanças climáticas. Eu sempre comento com meus clientes que, antigamente, nossos pais pensavam o que deixar para os filhos em termos de patrimônio, casas ou dinheiro. Hoje, você tem que pensar no planeta e no mundo que você vai deixar para os seus filhos. O mundo está sentindo as consequências, mas a devastação ainda continua.

Nesse sentido, eu acho que as pessoas devem tratar a madeira como uma coisa preciosa, semelhante ao diamante e ao ouro. Na fábrica, por exemplo, nada se perde. A única coisa que eu falo que não é aproveitado é o berro da lixadeira (risos), ou do desengrosso. Existem várias peças também que a gente faz com resíduos. A serragem vai para uma granja e tudo é reciclado. Também já participei de um evento que se chamava Joias da Floresta. Nessa ocasião, produzi joias mesmo, como anéis de madeira, ouro e diamante.

Em 1993 você instalou o seu primeiro showroom aqui em São Paulo, na Vila Madalena. Desde então, uma série de designers renomados como Claudia Moreira Sales, Lia Siqueira e Carlos Motta já contribuíram com o acervo da loja. De acordo com o site da ETEL Interiores, esse corpo de profissionais qualificados “contribuem para a construção e manutenção do DNA ETEL”. Para você, o que é esse “DNA”?

Com esse DNA da ETEL toda peça produzida é numerada. Quanto menor for a tiragem da produção, mais valor a peça poderá ter. Todo objeto vem acompanhado pelo seu número, que mostra quem fez, quem desenhou, a data em que foi criada e a data em que está sendo produzida. A peça vem com uma plaquetinha de metal que traz o logo da ETEL e esse número, que é o DNA. Vem também, acompanhado da peça, um certificado de garantia escrito manualmente. Desse modo, se você tiver uma peça da ETEL e amanhã quiser vender, você tem um certificado de garantia e de autenticidade.

O DNA, então, funcionaria também como um selo de qualidade?

Isso mesmo. Funciona como uma espécie de selo de qualidade.

Em 2013, o showroom da ETEL Interiores em São Paulo comemorou seus 20 anos de existência. Nesse encontro foram destacados três conceitos que, de certa forma, resumem o trabalho desenvolvido até agora. Os conceitos apresentados foram “uma marca singular”, “uma coleção representativa” e “um espaço que une arte e design”. Na sua visão, como esses conceitos se articularam e se desenvolveram desde a fundação do showroom, em 1993, até agora, em 2013?

Como eu lhe falei, desde o início a arte sempre esteve envolvida na história. A ETEL nasceu em virtude da arte. Na Vila Madalena, por exemplo, tínhamos um galpão que era pura arte. No chão tinha Gaudi e nos muros eu sempre colocava obras de arte, mas agora abri espaço também para uma exposição das fotos do Araquém. Sempre tivemos obras do Roberto Micoli também, gosto muito dele como artista, além de ser meu amigo de muitos anos. Fizemos um evento misturando a arte com o design, com biombos que eram telas do Micoli com a parte de marcenaria realizada pela ETEL. Tivemos também as caixolas do Marcelo Cipis, em que eu fiz a parte de madeira e ele fez a ilustração e pintura.

A ETEL é uma marca singular porque todos os conceitos que nós trabalhamos são verdades. Nada do que fazemos aqui é por causa de modismos. Atuar com o design brasileiro acabou sendo uma consequência, porque eu sempre nasci e trabalhei com isso. Assim, quando eu comecei a reeditar e a materializar a história do design brasileiro, ninguém conhecia, ninguém se lembrava de Jorge Zalszupin, por exemplo. Nossa loja também virou um campo de estudo da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU-USP) e da Fundação Armando Álvares Penteado (FAAP). Na época de final de ano a loja fica cheia de alunos que vem para fazer pesquisa.

Por fim, a ETEL tem uma coleção representativa porque é uma marca forte. Nós temos aqui os maiores nomes do design brasileiro, incluindo artistas contemporâneos também. Temos Isay Weinfeld, Claudia Moreira Salles, Lia Siqueira, Carlos Motta, entre outros. Fabricamos e comercializamos peças de todos esses artistas.

Ao longo das entrevistas, percebemos que o conceito de design é entendido de maneira muito variável pelos profissionais da área. Na sua visão, o que é design?

É uma questão difícil. Para mim, uma peça deve ter um bom desenho e ser bem elaborada. Eu, quando vou desenhar um objeto, sempre penso na beleza, na funcionalidade e na qualidade. Uma peça precisa ter qualidade. Uma peça tem que ser bela, porque o primeiro sentido humano é o olhar. A beleza de um produto é o que chama a atenção do observador num primeiro momento. Podemos até criar uma peça diferente, que apresente formas não usuais, mas ela deve ser bonita e precisa ter funcionalidade. Eu gosto muito da coisa lúdica também, então toda peça que eu faço sempre tem uma surpresa. Em resumo, eu acho que design é isso: é esse conjunto de atributos reunidos numa única peça.

Há muitos anos você está envolvida em projetos sustentáveis que utilizam madeira de manejo florestal da região amazônica. Em 2001, como você já mencionou, a ETEL foi uma das primeiras empresas moveleiras do Brasil a conquistar a certificação do FSC (Forest Stewardship Council). Qual foi a importância e os impactos causados com a aquisição desse certificado para o trabalho da ETEL Interiores?

Para mim, a aquisição desse certificado foi muito importante porque veio ao encontro da minha filosofia. Quando eu soube que isso existia, me surpreendi. Fui levada para conhecer o projeto e fiquei super impressionada porque, até hoje, não existe outra forma de se preservar a floresta a não ser pelo manejo. Na minha opinião, o manejo é uma ferramenta muito importante de preservação. Contextualizando um pouco com o cotidiano: você, por exemplo, é um herdeiro que ganhou uma floresta de dinheiro, mas se você for lá e começar a derrubar as árvores aos poucos, chega uma hora que acaba. Assim, fica aquela história: avô milionário, pai rico e neto pobre, porque as gerações não preservam a herança. Dessa forma, é importante divulgar esses projetos e iniciativas para todos os tipos de pessoa. A minha dica é que quando forem comprar madeira, perguntem a origem e vejam se ela é certificada. Se você não tem muito conhecimento sobre o assunto, pelo menos questione. Aqui mesmo, na Alameda Gabriel Monteira da Silva, se você perguntar se a madeira é certificada as pessoas vão responder “Sim, é certificada”, mas se perguntar “Você sabe o que é certificação?”, as pessoas dizem que não sabem.

Sabe que existe, mas não sabe o que é.

Sim. Então, para mim, esse certificado foi muito importante. Como eu já pregava essa filosofia, os impactos trazidos com o FSC vieram incentivar positivamente o nosso trabalho.

Em 2002 você fundou a AVER Amazônia, instalada no estado do Acre, que trabalha com a capacitação profissional dos povos da floresta. Como surgiu esse projeto? Quais são os principais objetivos dessa iniciativa?

Essa floresta, com quem eu tenho ligação, é uma floresta comunitária. Na época eu fui convidada pelo governador do estado, Jorge Viana, cuja levantava a bandeira do “governo da floresta”. Ele queria fazer um trabalho com os seringueiros dentro da Reserva Chico Mendes, com todos sobrinhos, irmãos e demais parentes do Chico Mendes, para que eles entendessem e fizessem a certificação dessa floresta. Eu acabei me envolvendo e, do jeito que sou apaixonada por floresta e por gente, acabei indo e montei essa oficina. Essa foi a primeira floresta comunitária certificada no Brasil, até então só existia a Biomadeira, no Amazonas. E depois, a segunda floresta a ser certificada foi a do Cachoeiro, graças ao trabalho de um cientista chamado Virgílio Viana, que fez toda a capacitação. Ele também era presidente da Imaflora, uma das certificadoras.

Quem cuida da floresta são os seus próprios moradores, portanto nada mais justo que projetos como esse se desenvolvam. Eu me envolvi e estou até hoje envolvida. É longe, tem horas que tenho vontade de desistir, mas é tão simbólico, é tão importante para o meu coração que eu vou. Trabalhar com essas comunidades é muito gratificante. Se cada um de nós fizesse a sua parte, o mundo seria bem melhor.

Como você enxerga a parceria entre designers e comunidades de artesãos?

Pela minha trajetória, eu vejo que existe uma sinergia enorme entre artesãos e designers. Eu trabalho com 130 artesãos e a interação deles com os designers sempre foi muito boa. Na minha opinião, o designer, o criador, precisa do artesão para materializar as suas ideias. Eu não seria nada sem o Moacir. Eu tinha o conhecimento da criação, do desenho, mas não sabia como fazer, como tornar aquilo real, material. Um não vive sem o outro.

Um complementa o outro?

Sim. Um complementa o trabalho do outro.

Os produtos que trazem a marca ETEL são considerados hoje como a alta costura do mobiliário brasileiro. Além disso, diversos desses produtos já alcançaram presença nos principais mercados internacionais (como Nova York, Los Angeles, Londres, Lisboa, Zurique e Toronto). Em sua opinião, o que ocasionou esse grande reconhecimento nacional e internacional dos produtos confeccionados pela ETEL?

Eu acho que são vários fatores. Primeiro, a construção, dado que é algo que quase não existe mais no mundo. Hoje é tudo industrializado, fica tudo com a mesma carinha, massificada. Quase ninguém usa mais a madeira sólida. Usa-se MDF, enfim, só folhado. Aqui, na ETEL, nós usamos madeira maciça. Toda a construção é feita à mão. Nossos produtos também apresentam uma qualidade diferenciada. Queremos que um móvel feito hoje, daqui a quinhentos anos ainda continue impecável. Na minha visão eu acho que o mundo está mudando um pouco seus conceitos de valores, principalmente em relação ao descartável. As pessoas estão meio arredias a isso. Aqui, por exemplo, há vários colecionadores que compram ETEL como investimento: não só porque são peças bonitas, mas porque eles sabem que vão durar.

Nós também temos muita seriedade, sempre nos preocupando com o DNA, com o certificado de origem. Isso, no mercado externo, é muito valorizado. Grandes designers brasileiros, como o Jorge Zalszupin – que, para mim, é um Picasso – não eram conhecidos. O Branco e Preto também tem coisas lindas, só que ninguém (nem o mercado internacional) tinha conhecimento. Quando eu comecei a reeditar obras desses grandes designers, a mídia veio em cima e esse trabalho se espalhou no mundo. E quando algum estrangeiro vê a qualidade da peça, aí não tem para ninguém. Uma vez me perguntaram na Europa quanto tempo levava para fazer uma mesa marchetada; eu falei “de um a dois meses de trabalho”. Eles ficaram assustados, pois achavam que demorava um ano para o artesão fazer aquela peça. Então, eu acho que tudo isso contribui para nosso sucesso e para o respeito da marca ETEL. Pela seriedade e pelo compromisso assumido, a marca foi sendo construída por meio do trabalho mesmo, não foi através de marketing; antigamente, eu não fazia anúncio nenhum. A gente está sempre inovando, criando e mostrando seriedade, compromisso, qualidade e novidade para o mercado. Dessa forma, a marca ETEL acaba trazendo credibilidade, construída através do trabalho, do serviço interno. Não é só o produto, mas é o serviço também. Muitas vezes, você tem até um produto de qualidade, mas não tem uma qualidade de serviço, de compromisso. Compromisso com a palavra: se tal dia a gente combinou de entregar, se ocorrer qualquer imprevisto, a gente vai avisar. Não podemos deixar o cliente esperando sem dar uma satisfação.

Esse relacionamento com o cliente é muito importante?

Muito importante. Tanto que nosso representante no Canadá só trabalha com a ETEL, aqui no Brasil. Na opinião deles, nós somos a melhor marca com a qual eles trabalham do mundo. Isso ocorre porque além da nossa qualidade, também temos compromisso. E olha que ele trabalha com marcas alemãs, italianas, francesas, americanas. Tudo isso acaba se tornando um diferencial da marca.

Aproveitando a recepção que os produtos da ETEL têm no exterior, como você enxerga a percepção dos estrangeiros em relação ao designer brasileiro?

Muito boa. Eles ficam encantados com o que produzimos aqui. Ontem mesmo, tivemos um casal de franceses passeando pela loja e eles saíram daqui encantados. Recentemente fizemos uma grande exposição no Canadá sobre o design brasileiro e as pessoas se encantaram. Na semana de realização do evento foi vendido Niemeyer, Jorge, Carlos Motta, Etel. O Carlos esteve aqui na semana passada com um sorriso enorme, contente com a percepção da beleza do design brasileiro no exterior.

Desde o início, quais foram as principais dificuldades enfrentadas pelo trabalho que você e a sua empresa desenvolvem?

Sinceramente, foi tudo tão escrito nas estrelas, foi tudo tão mágico, que eu acho que nunca tive dificuldade. Eu sou uma pessoa muito correta e muito séria. Minha palavra vale mais que minha assinatura, como dizia meu pai. Então, uma das coisas que eu mais valorizo é o respeito e o compromisso, tanto que o Fúlvio não queria abrir mão de mim por nada.

Muito antes de começar com o trabalho de reeditar o design brasileiro, de contar a sua história no Brasil, eu já tinha um nome muito respeitado nesse mundo do design. “A Etel? O trabalho dela é impecável! Ela tem compromisso”. Eu acho que isso foi e vai ser sempre o legado da Etel para uma marca: não se prostituir, presando sempre pela qualidade do trabalho e do serviço.

A ETEL é uma empresa familiar, desse modo estou fazendo a minha sucessão. Por isso, espero que minhas filhas tenham no sangue isso também, de não perder esse DNA da ETEL: que é o respeito, a qualidade do produto e a qualidade do serviço. Eu não vou aumentar a produção. Eu não vou ser uma indústria porque não desejo que os nossos produtos percam a sua essência e virem outra coisa. A peça pode até ter um bom desenho, mas não terá a mesma energia do que a gente faz hoje. Para mim, é isso que faz a ETEL ser essa marca forte. Uma vez que você entrou aqui, você vira nosso cliente e fica para o resto da vida. Tenho clientes que não conseguem dar presentes se não for daqui. A casa inteira já está toda mobiliada com peças da ETEL. Tenho cliente aqui desde a hora zero, que sabe que o nosso trabalho tem um valor, responsabilidade e qualidade.

Assim, de maneira geral, eu não tive muitas dificuldades porque as coisas foram acontecendo e eu fui simplesmente acompanhando. Quando eu vi, estava lá na Amazônia, sozinha, no Acre (risos). Eu voava, fazia escala e não chegava nunca. Estava no fim do mundo (risos). Mas eu fui! Tudo foi se encaminhando naturalmente, magicamente.

E para o futuro, quais são as prioridades em seu trabalho como designer?

No ano que vem temos mais coisas para criar. Estamos pensando em trabalhar com alguns outros nomes do design brasileiro, que eu não posso lhe falar ainda pois estamos em negociação. Dos contemporâneos, muitos permanecem. Provavelmente teremos uma nova coleção do Isay Weinfeld. E tem um projeto com os novos talentos também, pois vejo que a ETEL deve dar chance para outras pessoas boas que estão nascendo no mercado. Eu, Carlos Motta e Maria Cecília Loschiavo (que é da Academia), queremos montar um conselho aqui na ETEL também, para atuar com a curadoria. Nós sempre fizemos uma curadoria, mas eu sempre penso muito com a minha intuição, olhando a personalidade, se o santo bate ou não bate, se o desenho tem qualidade. Você pode ver que aqui tem Isay, Niemeyer, Claudia Moreira Salles, Jorge Zalszupin, e todo mundo se conversa. Todo mundo interage, ninguém está fora do contexto. Essa é nossa força. Então, esses novos talentos também devem ter essa mesma linguagem, devem dialogar com o que temos. Estes são os projetos futuros para 2014, 2015.