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A CASA E O MUNDO

ENTREVISTA

DURCELICE CANDIDA MASCÊNE

Publicado por A CASA em 12 de Fevereiro de 2014
Por Ivan Vieira

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"Trabalhamos para consolidar o artesanato como uma importante força econômica do Brasil"

Durcelice Candida Mascêne é Coordenadora Nacional da Carteira de Projetos de Artesanato do Sebrae.

De onde vem e como surgiu a sua relação com o artesanato? Como ocorreu a sua inserção no Sebrae?
Comecei a trabalhar no Sebrae em 1993. Na época eu já entrei numa área que cuidava da parte de comercialização e acesso a mercado. Em 1997, o Sistema Sebrae começou a trabalhar com o setor de artesanato, onde iniciamos a construção de um projeto para o desenvolvimento do setor artesanal. Então foi criado o nosso escopo de atuação, que é baseado no tripé: capacitação, formação e mercado. Durante todos esses anos nós sempre buscamos garantir a sustentabilidade do mercado de artesanato. E também nós sempre trabalhamos para fortalecer a parte da produção, procurando adequar os produtos ao mercado por meio da padronização e inovação.
Hoje nós procuramos formar uma base de formação para o segmento artesanal. Uma base que seja confiável e que possa nos dizer qual é a importância dessa atividade para a economia do Brasil. A partir disso, começamos, no ano passado, a fazer um levantamento de dados sobre o segmento. Desde então temos falado muito com o PAB (Programa do Artesanato Brasileiro) sobre o sistema de cadastramento do artesanato em nível nacional. Hoje em dia, a única forma legal que realmente valida a profissão do artesão no Brasil é uma carteirinha, emitida pelo PAB através desse sistema de cadastramento. Existem vários projetos que tramitam no Congresso, no Senado, mas não tem nenhuma lei que legitima a profissão do artesão. Então, toda essa falta de uma legislação específica acaba trazendo uma ausência de base legal para o segmento.
Além disso, também temos uma série de fatores que atuam de forma muito direta sobre a produção artesanal, como embalagens, logística, preço do frete, etc. São questões que interferem desde o núcleo produtivo até ao acesso do produto pelo consumidor. O Sebrae trabalha com a capacitação, formação e a gestão de negócios para a formação e fortalecimento desse mercado. Enxergamos o artesanato como uma forma de abrir oportunidades para as pessoas.

De acordo com o Termo de Referência: Atuação do Sistema Sebrae no Artesanato, artesanato é "toda atividade produtiva que resulte em objetos e artefatos acabados, feitos manualmente ou com a utilização de meios tradicionais ou rudimentares, com habilidade, destreza, qualidade e criatividade". Quais as vantagens dessa atividade como ferramenta para o desenvolvimento social e econômico?
O artesanato possui uma elevada função econômica e tem uma importância muito grande na mudança da qualidade de vida das famílias envolvidas, já que traz um desenvolvimento enorme para a comunidade produtiva. Inúmeros locais ou cidades acabam sendo promovidos por causa da atividade artesanal. O artesanato tem uma grande capacidade de consolidação e desenvolvimento local, desde que seja tratado como detentor de uma função econômica. No Sebrae a gente trabalha com a visão de negócio para consolidar o artesanato como uma importante força econômica do Brasil.

Quais as maiores dificuldades do artesão brasileiro e como o Sebrae pode atuar em seu apoio?
Pelo o que eu vejo, um dos principais problemas enfrentados pelo artesão é a carência de investimentos. O Sebrae pode ajudar nessa questão provocando uma aproximação entre artesãos e instituições financeiras – porque nós prestamos diversos auxílios à comunidade, mas não podemos financiar a produção. Assim, procuramos trazer instituições financeiras para que elas entendam o segmento e desenvolvam alguns produtos customizados para a realidade econômica e social destes artesãos.
Outra grande dificuldade que nós percebemos é a gestão dos negócios. Nós, do Sebrae, trabalhamos muito nessa área, ajudando o artesão a se manter no mercado com qualidade, obedecendo aos prazos e as exigências impostas pelo mercado como etiqueta, embalagem e notas fiscais. Promovemos essas ações para que os artesãos atinjam e fidelizem o mercado.

Na sua opinião, portanto, uma das maiores dificuldades do artesão, hoje, é a comercialização de seus produtos?
O problema da comercialização acaba sendo uma das consequências trazidas com a falta de organização da cadeia produtiva, o que envolve capital de giro, gestão, matéria-prima, inovação. É todo um sistema que, se não for gerido da forma correta, impacta na redução da comercialização. Isso ocorre porque o artesão atinge o mercado, mas não consegue permanecer pela falta de orientação e organização. Ele chega até o mercado, mas como não consegue dar a resposta que o mercado busca, os negócios recuam e a venda de produtos fica comprometida.

Atualmente se fala muito da relação entre artesanato e design. O Sebrae tem considerado a parceria entre designers e artesãos em seus projetos?
Nós sempre trabalhamos, desde o início, com essa relação entre design e artesanato. Vemos essa interação entre os dois grupos como uma construção coletiva. O artesão e o designer somam os seus saberes e criatividade. O designer chega nas comunidades levando seu conhecimento com relação as perspectivas de mercado e funcionalidade de produtos para que os artesãos desenvolvam peças que cumpram as necessidades do mercado, mas todo o processo é formado e construído de forma coletiva. Hoje em dia o Sebrae já tem uma metodologia de formação de designers para trabalhar com o setor de artesanato.

Mas como se dá, de forma mais específica, essa relação entre designers e artesãos? O que é passado de um grupo para o outro? Como acontece essa interação?
É uma interação coletiva. Os dois somam e compartilham o conhecimento. O designer não intervém na identidade cultural dos produtos. Isso permanece. O designer leva o conhecimento dele para a adequação do produto em relação ao mercado. O artesão leva a criatividade e a identidade cultural dele. Isso gera um diferencial competitivo no produto.

Nós já ouvimos algumas críticas que dizem que há uma interferência intensa do designer sobre o trabalho do artesão nos projetos desenvolvidos pelo Sebrae, levando a casos onde o produto artesanal pode até perder algumas de suas características...
Não, não. Nós sempre trabalhamos respeitando a identidade cultural de cada comunidade. Esse caso pode eventualmente acontecer em alguns locais, porque a gente não tem como controlar todos os projetos que acontecem no Brasil inteiro. Mas nós sempre orientamos que a intervenção do designer deve preservar a identidade cultural do local.

O Sebrae vem desenvolvendo uma série de ações que buscam incentivar o artesanato brasileiro. Dentre elas, temos o Top 100, o Brasil Original e o CRAB (Centro de Referência do Artesanato Brasileiro). Qual é o objetivo de cada um desses projetos? Como eles podem contribuir para o desenvolvimento do artesanato brasileiro?
O Top 100 é um prêmio criado em 2006. Estamos na terceira edição e a quarta já deve começar nesse ano. É uma iniciativa que premia a gestão da unidade de produção, com a lógica de que se o negócio de artesanato da unidade produtiva tem uma boa gestão, ele consegue permanecer no mercado. Então, é um projeto que premia as unidades produtivas mais competitivas do Brasil na questão “gestão”. Depois disso, geramos um catálogo comercial com o objetivo de atingir o mercado.
O Brasil Original é uma ação pensada para os jogos esportivos. É uma ação que vem desde o ano passado e vai até 2016. Um dos principais objetivos dessa iniciativa é o reposicionamento do artesanato, fazendo com que esses produtos fiquem depositados na cabeça do consumidor. Então a proposta é de estarmos em locais como shoppings, com produtos desenvolvidos em parceria com designers e que sejam colocados em pontos estratégicos para uma reeducação do consumo do artesanato do Brasil. Todos os produtos que vão para esses showrooms passam por uma curadoria.
E o Centro de Referência do Artesanato Brasileiro (CRAB) é um projeto que visa reunir toda a base de informação do artesanato no Brasil. Ele ainda está em construção, no Rio de Janeiro. Iniciamos agora o processo de reforma do prédio. A ideia é construirmos um centro de referência do artesanato brasileiro que reúne toda a base de informação sobre esse seguimento (do Brasil e até de outros países). O objetivo é proporcionar uma troca de experiências e elaborar uma base de informação.

Em relação ao Top 100, como funciona o posicionamento de cada um dentro do prêmio? Como ele é concedido? Como ele é avaliado?
Na terceira edição nós não tivemos ranking. São premiadas as cem iniciativas mais competitivas do Brasil. Não é estabelecido um ranking para essa premiação. Estamos estudando algumas reformulações para a próxima edição, mas por enquanto não existe ranking. Os 100 premiados representam um conjunto das unidades produtivas mais competitivas do Brasil.

Esse conjunto é representado pelo objeto ou pela unidade produtiva?
Pela unidade produtiva. Nós temos onze critérios mercadológicos de seleção. Dentro destes onze critérios são formadas 33 perguntas. Durante a inscrição, nós lançamos um website onde a unidade produtiva entra e responde às perguntas. A partir daí, o website nos dá um recorte das duzentas unidades mais bem formadas e aí, nós temos toda essa base de informação. Feito isso, nós capacitamos os consultores para que eles façam visitas in loco, a fim de fazer a auditoria do que o grupo respondeu. A partir daí, eles geram outro relatório que vai para um júri de especialistas. Depois de analisar todos esses relatórios dos consultores, o júri seleciona as cem melhores unidades.

Em relação ao Brasil Original, quais são os critérios para a escolha dos locais que receberão os showrooms?
No ano passado foram feitos cinco showrooms experimentais, todos em shoppings. Em Brasília, foi no Park Shopping; em Belo Horizonte, no Boulevard Shopping; e no Rio de Janeiro, no Rio Sul. O único que não aconteceu em shopping foi o de Fortaleza, que ocorreu na Avenida Monsenhor Tabosa, um ponto comercial grande da cidade. Esses showrooms são colocados nos grandes shoppings de classe A e B das capitais sedes da Copa. Assim, nós montamos uma loja onde se mostra artesanato feito com qualidade, num espaço onde essa peça possa ser vista como objeto de desejo. Esse processo é de reposicionamento do consumo de artesanato, porque queremos que as pessoas (principalmente os brasileiros), tenham interesse e se apaixonem pelo artesanato nacional. Queremos que essas pessoas tenham o desejo de ter uma peça de artesanato dentro de sua casa.

Levando em consideração o Top 100 e o Brasil Original, que já ocorreram algumas vezes: como você avalia o resultado desses projetos? Quais foram os erros e os acertos e o que você espera desses projetos para o futuro?
Nós começamos o Top 100 em 2006. É um prêmio trienal, então as inscrições para a quarta edição já começam no final deste ano. Esse é um projeto que consolidou uma marca, que traz grandes resultados para as unidades produtivas que passaram pelo processo. Tem unidade produtiva que mudou muito, deixando a informalidade para se tornar uma pequena empresa. Tem também unidade produtiva que graças à divulgação, por ser ganhadora, conseguiu aumentar as vendas. Teve um caso em que a unidade teve que virar uma “industrianato” para atender a demanda. Isso é uma opção de cada um também, mas creio ter sido apenas um caso. De qualquer forma, vemos que o resultado muito impactante. A visibilidade dada aos produtos com a montagem dos primeiros showrooms em 2013, na Copa das Confederações, trouxe resultados muito expressivos para as unidades produtivas que participaram.

De modo geral, um dos principais objetivos do Sebrae é "trabalhar para estimular o empreendedorismo e possibilitar a competitividade e a sustentabilidade dos empreendimentos de micro e pequeno porte". Considerando a atuação do Sebrae especificamente na área do artesanato, esse objetivo é contemplado? Como vocês avaliam os resultados alcançados?
Nós continuamos trabalhando com a noção econômica e de competitividade. Estamos trabalhando para que as unidades de artesanato se formalizem, porque sabemos que a única maneira de atingir o mercado é por meio da formalização. E nós sempre estamos reavaliando o que não deu certo para tentamos corrigir. Também buscamos parcerias com instituições que possam trazer um diferencial econômico para essas comunidades. O artesanato no Brasil é um segmento muito complexo. Hoje nós percebemos que o artesão tem uma deficiência grande de representatividade de classe e que a formação política desse grupo é muito importante para a sustentabilidade do negócio e para que eles saibam buscar os seus direitos como cidadãos.

Existe alguma avaliação dos projetos para saber o que foi mudado na comunidade com a chegada do Sebrae?
Nós possuímos algumas avaliações que são feitas internamente. A partir desse ano nós vamos fazer um levantamento para ver o real impacto da atuação do Sebrae no artesanato brasileiro. Queremos ver os impactos e os resultados desse trabalho que já é feito durante anos em diversas comunidades.

Atualmente, muitas instituições e profissionais que trabalham com comunidades de artesãos têm encontrado dificuldades na venda dos produtos. No Seminário Objeto Brasileiro e Mercado, a Maíra Fontenele Santana, também do Sebrae Nacional, mencionou que uma das ações prioritárias da instituição no setor artesanal é “o reposicionamento do artesanato como fortalecimento da comercialização”. Como isso é possível? Por que muitas comunidades ainda encontram dificuldades para comercializar os seus produtos?
O Brasil Original é uma dessas estratégias de reposicionamento. E existem outras ações que o Sebrae de cada estado executa para o fortalecimento dos negócios. Nós, em nível nacional, também temos o Top 100, que procura aproximar o artesanato do comércio por meio da elaboração de um portfolio de mercado. Nós premiamos e entregamos catálogos para lojistas, formadores de opinião, embaixadas. E o CRAB, ao reunir uma grande base de informações sobre o setor, também pode se hospedar num meio informatizado a fim de que seja possível uma aproximação comercial entre artesãos e consumidores. O Sebrae busca, por meio de projetos estruturantes, fazer esta aproximação comercial.
Em nível nacional nós temos o Brasil Original, que é uma ação enorme destinada aos jogos esportivos. E também temos lojas que são montadas dentro de grandes eventos, como Fenearte e Feira Nacional, onde comercializamos os produtos das unidades produtivas. Isso traz muitas demandas. Por meio da loja no Fenearte, por exemplo, nós tivemos uma compra da Caixa Econômica Federal. Dessa forma, pretendemos elaborar projetos que busquem canais permanentes de comercialização. Para isso, também contamos com o auxílio de uma ferramenta do próprio Sebrae, o Comércio Brasil.
Dessa forma, nós procuramos fazer a nossa parte, só que não temos condições de dizer que resolvemos o problema comercial do artesanato do Brasil. Dentro do nosso escopo de atuação existem limites orçamentários, mas a ideia é sempre ir atrás do reposicionamento desse setor. Então, a nossa estratégia para essa gestão é fortalecer a comercialização do artesanato do Brasil, já que a venda de produtos nesse setor é muito deficiente. Só que esse reposicionamento não é só feito por meio de ação comercial. Existe um trabalho anterior a isso, que se refere à gestão, organização da produção e desenvolvimento de processos que atualmente entravam o comércio, como embalagens, nota fiscal eletrônica e transporte. Essas são questões que devem ser resolvidas para que o produto consiga chegar ao mercado e não tenha vendas pontuais, mas que consiga se consolidar e fidelizar o mercado.

Outro ponto levantado pela Maíra no seminário foi o estudo que o Sebrae vem realizando sobre a tributação para o artesanato no Brasil. A carga tributária e fiscal também atua como um fator que dificulta a comercialização de produtos artesanais?
Nós contratamos, em 2013, um consultor para fazer um estudo comparativo sobre a tributação fiscal do artesanato no Brasil. Uma das grandes incógnitas em relação a esses tributos é o ICMS (Imposto sobre circulação de mercadorias e prestação de serviços), porque encontramos uma grande dificuldade em descobrir qual é a porcentagem de tributação que esse imposto leva. Com esse levantamento também pretendemos fazer uma aproximação com a Secretaria da Micro e Pequena Empresa (SMPE), para que juntos possamos construir uma proposta de melhoria. Estamos pensando em modos que facilitem o trâmite aduaneiro do artesanato no Brasil. Esse setor é muito conflitante porque há uma norma que isenta de impostos a atividade artesanal do território brasileiro, mas ao mesmo tempo existem portarias estaduais que tributam o artesanato. É uma questão muito polêmica. Seria preciso ter uma ação de política pública federal para que o artesão fosse enquadrado no Super Simples ou em outra lei. Talvez, por exemplo, a carteirinha do artesão emitida pela Secretaria da Micro e Pequena Empresa pudesse ser um instrumento que regularizasse a questão da tributação desse segmento no Brasil. Essas são questões que nós trabalhamos com a SMPE e o PAB (Programa do Artesanato Brasileiro), já que esses são os órgãos que legislam o artesanato no Brasil. Nós fizemos um estudo tributário/fiscal inicial e estamos procurando a SMPE para dar andamento nesse processo. E com certeza, a nossa intenção é inserir cooperativas e representantes de classe nessa discussão, já que eles têm conhecimento e poder de argumentação para construir, junto com a secretaria, alguma saída para esse entrave da aduana.

Uma das ações que o Sebrae vem desenvolvendo atualmente se baseia na construção e disponibilização de conhecimento sobre o setor de artesanato no Brasil. Qual é a importância dessa iniciativa? O que já foi alcançado até o momento?
Quando a gente começou a trabalhar, em 1997, havia uma escassez enorme de conhecimento sobre o setor de artesanato. Hoje em dia nós já temos muito conhecimento, mas que ainda está pulverizado em diversas instituições. Atualmente também já foram feitas inúmeras dissertações de mestrado, teses de doutorados, monografias de graduação, etc. Hoje, você já encontra muita informação, mas quando nós iniciamos o trabalho em 1997 não tínhamos quase nada. Havia uma deficiência enorme, mas nos últimos anos esse banco de informação tem crescido muito, não só no Sebrae. Nós tentamos trabalhar toda essa base de informação, mas outras instituições também fazem o mesmo. Existem vários órgãos que se ocupam desse trabalho – só em nível ministerial há sete ministérios que trabalham com o segmento do artesanato no Brasil. Muitas ONG’s também trabalham com esse setor há vários anos. Entretanto, essas bases de dados estão pulverizadas. Dessa forma, o principal objetivo do Centro de Referência é a consolidação de todas essas informações.
Começamos a dedicar atenção a essas questões quando iniciamos a construção do Termo de Referência, lançado em 2004 e reeditado em 2010. Em 2015, provavelmente, faremos uma nova readequação desse documento para que possamos ter formas de atuação que acompanhem as mudanças enfrentadas pelo setor nos últimos anos.
O Sebrae se preocupa com a construção de conteúdo sobre a atividade artesanal. Estamos sempre procurando uma fonte de informações. E nós queremos, nos próximos dois anos, elaborar uma pesquisa que pelo menos balize os resultados obtidos pelo Sebrae na área de artesanato. Queremos medir os impactos e avaliar os erros e acertos. Ter informações sobre o artesanato é importante para a manutenção da cultura e da identidade das comunidades produtoras.

O Sebrae, mesmo sendo uma entidade privada, desenvolve projetos e atua de forma muito próxima ao governo estadual e federal. Nesse sentido, como o Sebrae pode contribuir e atuar junto à esfera pública para a elaboração de políticas na área do artesanato?
Hoje em dia, grande parte do trabalho que o Sebrae faz é de parceria com governos estaduais, prefeituras e com o governo federal. Sempre falamos que o Sebrae não tem como realizar nada sozinho. É um trabalho de parceria.
Recentemente, o Programa do Artesanato Brasileiro (PAB) saiu do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC) e foi para a Secretaria de Micro e Pequena Empresa. Então, eles estão passando por um processo de reconstrução da atuação deles no segmento artesanal. Nesse sentido, o Sebrae entra como animador do processo, para levar a parceria do conhecimento e somar esforços. Atuamos desse modo para buscar parcerias com outras instituições públicas, como o IBGE, por exemplo, para incluir o artesanato no censo – garantindo, assim, que os artesãos sejam contabilizados e possamos ter uma ideia de qual é a quantidade oficial de artesãos atuando no Brasil.
E estamos nos unindo ao governo federal para trazer outras soluções e melhorias. Na questão de logística, podemos ver como os Correios podem nos ajudar a minimizar os problemas enfrentados hoje em dia. Em relação à educação, nós podemos entrar em contato com o Ministério da Educação para criar um programa de diminuição do número de artesãos analfabetos.
Assim, o Sebrae faz o trabalho dele, mas sempre busca somar esforços junto com esses órgãos públicos, animando e levando a contribuição dele para que se busque melhorias para o segmento artesanal brasileiro.

Em diversas comunidades de artesãos, os mais jovens já não têm tanto interesse em permanecer no seu local de origem e acabam se mudando para cidades maiores em busca de uma vida diferente. Em sua opinião, esse fato pode dificultar a continuidade dos projetos desenvolvidos pelo Sebrae junto a comunidades de artesãos?
Sim. Inclusive essa é uma das grandes perguntas que eu faço para mim mesma durante todos esses anos que eu venho me envolvendo com o artesanato.
Quando eu chego em algum local e vejo que o filho do mestre não está interessado em dar continuidade ao trabalho do pai, eu pergunto: “Por que você não faz o que seu pai faz?”. Eu escuto a resposta: “Porque meu pai fez isso a vida inteira e não tem nada”. Então, se levarmos resultados positivos e provocarmos uma melhora na vida socioeconômica dessas famílias, esses jovens darão continuidade a tradição seguida pelos seus pais – trazendo até inovação, inclusive. Temos o exemplo do Levi, um dos filhos do mestre Cardoso, do Pará. O pai dele faleceu, mas ele continua seguindo a tradição, porém introduzindo inovações. Ele dá continuidade à tradição e aos traços marajoaras, mas traz inovação criando outras linhas de produtos – trabalhando com vitrificação, por exemplo. Hoje ele fornece embalagens de azeite até para empresas espanholas. Então, na minha opinião, no momento em que você trata o artesanato a partir do seu potencial econômico, você consegue trazer resultados e qualidade de vida para essas pessoas, possibilitando que esses jovens permaneçam e cultivem a tradição dos seus pais.

No Seminário Objeto Brasileiro e Mercado, a Maíra chegou a mencionar que há uma falta de formação política nos artesãos brasileiros. Na sua opinião, por que isso ocorre e como é possível reverter essa situação?
Nós, dentro do Sebrae, ainda não sabemos como inserir essa metodologia dentro da nossa parte de formação. De qualquer forma, acredito que essa formação política pode começar a ser construída se levarmos os artesãos a discutirem sobre questões inerentes a leis e política. É necessário que o artesão tenha dentro de si a consciência de que ele é um cidadão e deve lutar pelos seus direitos. O artesão precisa ter a consciência de que ele precisa, às vezes, sair um pouco da sua oficina de trabalho para discutir questões que são importantes para a sua classe, como impostos, comercialização e organização produtiva. O artesão é tão criativo que ele não gosta de sair do seu local de produção para ir a uma sala de aula. Acho que essa formação política só vai surgir quando os artesãos estiverem conscientes de que precisam parar um momento para sentar e discutir quais são os seus diretos como cidadão. Só assim será possível reivindicar questões que garantam melhorias para a sua classe como um todo.

Quais são as suas expectativas em relação ao trabalho do Sebrae nos próximos anos com relação ao artesanato?
Nós mudamos um pouco a nossa estratégia de atuação para os próximos três ou quatro anos. Pretendemos trabalhar intensamente a questão da organização produtiva, pois acreditamos que essa é uma importante forma de reposicionamento do setor dentro do Brasil. O Sebrae vem trabalhando muito nessa parte de reposicionamento do artesanato no mercado, para que essa atividade seja vista como um produto de consumo, para que o brasileiro tenha orgulho e desejo de ter um produto artesanal dentro de sua casa. Eu acredito que o Sebrae e seus parceiros têm um trabalho enorme pela frente. Existem algumas questões que ainda precisam ser trabalhadas junto com os representantes de classe. Na minha opinião, o grande desafio continua sendo a questão tributária e a formalização do artesão. A meu ver, é necessária a criação de uma lei específica para regulamentar o artesanato nacional. Introduzir um tratamento diferenciado dentro do setor – assim como já existe com o trabalhador rural, por exemplo – talvez seja uma ação muito importante para promover o desenvolvimento do artesanato brasileiro.