Editorial
A edição deste mês da newsletter está com um sabor especial. Visitamos Apiaí, um dos redutos do artesanato de tradição em São Paulo, e, em nossa Matéria do Mês, contamos um pouco da história da cerâmica local. Em Entrevista, focalizamos um dos grupos que é vítima, de acordo com nosso entrevistado, de desinformação e preconceito: os índios. Normalmente identificados com o passado, Luis Donisete aponta para a importância desse grupo no futuro do país. A produção material das comunidades indígenas também é assunto de destaque. Vale a pena ler a entrevista na íntegra! E uma boa notícia para todos aqueles que estão ocupados durante a semana e não conseguiam conferir nossas exposições: durante a exposição Brasil na África artesanato moçambicano + design brasileiro, A CASA estará aberta aos sábados! Venha nos fazer uma visita!
Acontece
no
museu A CASA
Cunha
Gago, 807
Exposição Brasil na África artesanato moçambicano + design brasileiro
Exposição traz peças feitas à mão em Moçambique, criadas e desenvolvidas por artesãos daquele país a partir de oficinas de artesanato orientadas por designers brasileiros, além de vídeos que contam a história do projeto. Resgatar técnicas e tradições locais, delinear a identidade cultural moçambicana e local, e apurar a qualidade do produto final eram os objetivos desse diálogo, que resultou em uma produção de artesanato com certificado de origem, que combina estética e design, tradição e inovação. De segunda a sexta, das 10h às 19h. Sábados, das 10h às 18h. Até 17/10. Saiba mais.
www.acasa.org.br
Exposição Virtual 1º Prêmio Objeto Brasileiro

Exposição virtual traz os 61 objetos e projetos que foram finalistas e premiados na primeira edição do Prêmio Objeto Brasileiro. Produzidos pela parceria entre designers e artesãos, os objetos vão desde luminárias, jóias e acessórios, a móveis e utensílios domésticos. O Prêmio teve mais de 1000 objetos e projetos inscritos, produzidos e realizados em 20 estados do Brasil. A exposição retrata o melhor da produção artesanal brasileira, com a pluralidade dos estados ali representados! Veja aqui.
Coleção Virtual Sérgio Rodrigues

Sérgio Rodrigues é, sem dúvida, um dos mais importantes nomes do design de móvel em madeira do Brasil. Seu trabalho contribuiu no sentido de dar uma cara ao móvel brasileiro. Nesta coleção, apresentamos uma seleção de peças suas, dentre elas, a Poltrona Mole. Veja aqui.
Museu A CASA no twitter

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Entrevista
- Luis Donisete Benzi Grupioni
"Uma contribuição indígena à produção de objetos tem a ver com a busca da perfeição e de significados que vão além da materialidade dos objetos"
Luis Donisete Benzi Grupioni é antropólogo e secretário executivo do Instituto de Pesquisa e Formação em Educação Indígena (Iepé)
Quais os principais desafios que se colocam hoje às comunidades e organizações indígenas?
Creio que um dos principais desafios esteja relacionado à busca de uma relação menos desigual, menos preconceituosa, menos conflitiva e menos equivocada com a sociedade e com o Estado brasileiro. Até bem pouco atrás, acreditava-se que os índios não tinham futuro, que a aculturação era uma caminho inevitável, que eles desapareceriam como totalidades socioculturais, integrando-se de modo indistinto às camadas mais pobres da sociedade brasileira. Contra esses prognósticos, nos últimos anos, acumularam-se evidências de que a população indígena no país crescia, ao invés de diminuir, e em ritmo maior que o restante da sociedade brasileira; que práticas culturais permaneciam vivas e estavam sendo retomadas por diversas comunidades; que as línguas indígenas, minoritárias e em situação de perigo, continuavam sendo faladas e começavam a ser utilizadas em processos de alfabetização nas escolas indígenas; que surgiam novas formas de representação indígena voltadas à defesa dos interesses das comunidades indígenas; enfim, muitos sinais foram indicando que os índios não estavam acabando nem iam acabar, ao contrário, que iriam fazer parte do futuro do país, mantendo suas identidades e sabendo manejar seus sentimentos de pertencimento étnico com seu lugar na sociedade nacional, enquanto cidadãos brasileiros.
Qual a contribuição indígena para o país em termos de produção de objetos?
No que se refere à produção material, este legado se compõe de artefatos hoje totalmente integrados ao modo de vida brasileiro, principalmente na área rural, em diferentes regiões do país, e está associado a técnicas de processamento de alimentos, pesca, caça, agricultura, conforto doméstico. Além desses artefatos, e dos conhecimentos a eles associados, vale lembrar que temos, e isso não vem de hoje, um consumo seletivo de objetos indígenas, com fins decorativos. Mas penso que uma contribuição indígena à produção de objetos seja menos tangível do que falamos até agora e tem a ver com a busca da perfeição e de significados que vão além da materialidade dos objetos. Muitos objetos indígenas revelam habilidade técnica, senso estético, e têm significados simbólicos compartilhados socialmente, que revelam e alimentam concepções de mundo únicas e particulares. Não raro, objetos indígenas, ricamente decorados, ultrapassam as funções utilitárias para as quais se destinam. A beleza presente nesses artefatos revela não só o exercício de uma prática artística, estética, como cria e estabelece relações sociais entre aqueles que os produzem e aqueles que os utilizam, e isso tanto em termos de atividades ritual e cerimonial quanto em termos de atividades cotidianas. É possível afirmar que, de modo geral, fazer objetos bem feitos, bem acabados, bem decorados, seguindo padrões estéticos reconhecidos pela comunidade, é algo muito valorizado em vários povos indígenas. O prazer estético advém tanto do alcance da perfeição, da destreza técnica, quando do reconhecimento comunitário.
Em que medida o artesanato faz parte da vida e do cotidiano do indígena atualmente?
Ele é exercido de forma ampla e coletiva, na medida em que os conhecimentos e os meios necessários para a sua execução são acessíveis a todos os indivíduos pertencentes a uma comunidade. Penso que o que vale a pena chamar atenção é que esse saber fazer é um bem coletivo, socializado entre todos, e desde cedo meninos e meninas são estimulados a aprenderem técnicas e ofícios para que se tornem bons fazedores. São também introduzidos no universo simbólico do grupo a que pertencem, aprendendo decorações, padrões, estilos, seus significados, os efeitos que eles causam nos objetos e nas pessoas que os usam, sua vinculação a explicações míticas e históricas. Esses conhecimentos também são socializados, coletivizados entre os indivíduos que compõem uma dada comunidade.
Muitas vezes, ao serem inseridos em novos contextos, objetos indígenas são resignificados e acabam ganhando novos usos. Assim, por exemplo, um cesto utilizado em rituais religiosos, cheio de simbolismos para uma cultura indígena do interior do Amazonas, pode tornar-se um cesto para roupa suja na casa de uma família de classe média em uma metrópole como São Paulo. Como você enxerga essa questão?
Os objetos no sistema indígena de produção e circulação de bens estão investidos de significados que se transformam quando são deslocados de contexto. Alguns perdem densidade, outros ganham. Veja, por exemplo, o que ocorreu com um dos últimos mantos Tupinambá existentes na Europa: ele virou patrimônio nacional do povo dinamarquês. Não é incrível que um objeto indígena, confeccionado no século XVII e levado do litoral brasileiro se torne um patrimônio nacional de um povo europeu? Então, você tem as duas coisas: você tem objetos que perdem significado e ganham outros sentidos e funções, como o do cesto para jogar roupa suja, e tem objetos que são investidos de novos significados. Acho que inclusive essa é a ponte que nos permite apreciar objetos indígenas como objetos de arte. Eles não foram feitos com essa intenção, nem para essa finalidade, mas os efeitos que eles podem nos causar, de admiração, de beleza, de nos intrigar, de serem inusitados, belos etc é que o nos permite incluí-los em galerias, museus e em exposições de arte.
Leia
entrevista na íntegra
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Matéria do MÊS
APIAÍ: A TRADIÇÃO DA CERÂMICA EM SÃO PAULO
Localizada no Vale do Ribeira/SP, Apiaí fica a 320 km da cidade de São Paulo. Temos notícias da cerâmica lá produzida desde 1950, quando os vasos de Apiaí foram reconhecidos por Oswald de Andrade Filho como “verdadeiras peças de arte”. A partir de então, pesquisadores e interessados têm documentado e se dedicado ao estudo da produção artesanal de cerâmica da região. As peças já foram expostas no Paço das Artes/SP (1979), no Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand/MASP (1981) e na Sala do Artista Popular do Museu de Folclore Edison Carneiro/RJ (1989 e 2002), e integram diversas publicações sobre artesanato e arte popular brasileira.
Em Apiaí é possível conhecer não só a cerâmica produzida atualmente como também peças pertencentes ao acervo municipal. A Casa do Artesão, localizada no centro da cidade, além de comercializar a produção dos artesãos da região, mantêm uma exposição permanente na Sala das Mestras, com exemplares da cerâmica tradicional de Apiaí. São peças zoomórficas e antropomórficas, potes, moringas e vasos datados da segunda metade do século 20, que formam um conjunto singular, de uma beleza ao mesmo tempo despojada e sofisticada. Informações sobre o processo artesanal de produção da cerâmica e amostras das diferentes tonalidades de barro encontradas na região complementam a mostra.
Tradicionalmente produzida nos bairros rurais da região, a cerâmica de Apiaí mantêmcaracterísticas do processo artesanal de produção documentado na década de 70: a atividade da cerâmica é complementar ao cultivo das roças e ao trabalho doméstico; desde a retirada do barro até a queima da peça, todas as etapas do trabalho são realizadas no próprio bairro; embora os homens ajudem em algumas etapas, como a coleta do barro e a construção do forno, são as mulheres que predominantemente criam e confeccionam as peças.
As mulheres são também as responsáveis pela transmissão deste saber tradicional às novas gerações. Ivone da Cruz de Lima aprendeu a trabalhar com o barro com sua mãe, Custódia Pontes. A produção de Ivone, que pode ser vista em seu paiol no bairro rural Encapoeirado, remete imediatamente aos potes de autoria de Custódia, expostos na Sala das Mestras da Casa do Artesão. Custódia, falecida em 2001, ensinou Ivone a modelar os potes de grandes dimensões, com pintura em tauá – barro avermelhado, próprio para pintura. Uma tradição que passa de mãe para filha, há diversas gerações, constituindo inestimável patrimônio cultural.
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A
CASA indica
Lina por escrito - textos escolhidos de Lina Bo Bardi

Publicados originalmente em revistas como as italianas Lo Stile, Grazia, Domus e A - Cultura della Vita, e em periódicos brasileiros como Habitat e Diário de Notícias de Salvador, os 33 artigos aqui reunidos repassam e propõem novos conceitos para temas como habitação, mobiliário, arte popular, museologia, restauro, educação e políticas culturais. Os textos são ilustrados por desenhos originais, fotografias e obras gráficas da própria arquiteta, incluindo alguns leiautes empregados na publicação de seus textos. A publicação revela Lina Bo Bardi como peça-chave na constituição de um olhar moderno sobre a cultura, tanto na Itália como no Brasil. Silvana Rubino e Marina Grinover (Orgs.). Editora Cosac Naify. 208 páginas. R$59,00. Saiba mais.
Loja do Museu Afro Brasil
Ao visitar o Museu Afro Brasil, não deixe de conhecer a loja da instituição. Reunindo diversas publicações de temática africana e catálogos das exposições, a loja traz também uma variada coleção de peças de artesanato brasileiro. A loja funciona no mesmo horário do museu: de terça à domingo, das 10h às 17h. Rua Pedro Álvares Cabral, s/nº. Pavilhão Manoel da Nóbrega. Parque do Ibirapuera, portão 10. São Paulo - SP.
Museu de Artes e Ofícios
Instalado na Estação Central de Belo Horizonte, por onde transitam milhares de pessoas diariamente, o Museu de Artes e Ofícios é um espaço cultural que abriga e difunde um acervo representativo do universo do trabalho, das artes e dos ofícios do Brasil, preservando objetos, instrumentos e utensílios de trabalho do período pré-industrial brasileiro. Praça Rui Barbosa, s/n (Praça da Estação) – Centro. Belo Horizonte – MG. Telefone: 31 3248 8600. Saiba mais.
Pinturas, desenhos e gravuras

Trata-se da primeira mostra da série de exposições do artista plástico e designer Nido Campolongo. A exposição, que será exibida na galeria de seu estúdio, é composta por 58 obras, entre pinturas, desenhos, colagens e gravuras de dimensões e técnicas variadas. De terça a sexta, das 14h às 18h. Sábados, das 11h às 15h. Até 31 de outubro. Rua Tupi, 843 - Santa Cecília. São Paulo-SP. Telefone (11) 3826 7901.
Boa
leitura
“A grande variedade de gosto, assim como de opinião, existente no mundo é muito óbvia pata ter escapado à observação de qualquer um. Homens do conhecimento mais limitado conseguem notar diferença de gosto no estreito círculo de suas relações, inclusive onde as pessoas tenham sido educadas sob o mesmo governo e imbuídas desde cedo dos mesmos preconceitos. Mas aqueles que conseguem alargar seus horizontes para contemplar nações distantes e épocas remotas ficam ainda mais surpresos com a grande inconsistência e contrariedade. Tendemos a chamar de bárbaro a tudo que se afasta bastante de nosso próprio gosto e apreensão, mas logo vemos o epíteto de reprovação se voltar contra nós. E a maior arrogância e auto confiança se vêem por fim surpreendidas ao notar uma igual segurança por todos os lados e, em meio a uma tal contenda de sentimentos, hesitam em se pronunciar positivamente a seu próprio favor”.
David Hume
Do padrão do gosto
Leia o texto na íntegra
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