Editorial
Em maio de 2014, A CASA museu do objeto brasileiro levou interessados em arte popular e produção artesanal a diversos municípios de Sergipe e Alagoas. Em Matéria do Mês, saiba mais sobre essa iniciativa que percorreu as cidades de Poço Redondo, Canindé do São Francisco, Piranhas, Entremontes, Ilha do Ferro, São Cristóvão, Laranjeiras e Divina Pastora.
Em Boa Leitura, confira o artigo de Thaís Fernanda Salves de Brito sobre os papeis sociais do bordado na vida de mulheres da cidade de Caicó, no Rio Grande do Norte.
Já em Entrevista, Angela Mascelani fala sobre a atuação e as atividades desenvolvidas pelo Museu Casa do Pontal, considerado o maior e mais significativo museu de arte popular do Brasil.
Acontece
no
museu A CASA
Pedroso de Morais, 1216
Criqué Caiçara

Com objetos produzidos por artesãos da comunidade da Barra do Ribeira, a exposição apresenta as novas peças da linha ‘Flores e Bichos da Reserva, Folhas e Seixos’, da Associação dos Jovens da Juréia. No dia da abertura será realizada a 11ª edição do Papo Artesanal e uma apresentação de fandango caiçara, dança típica da região. O evento é uma realização da Artesol, da empresa Accenture e conta com a parceria do museu A CASA. Abertura dia 15 de julho, das 19h às 22h30. Visitação de segunda a sexta, das 10h às 19h. Sábados, das 12h às 16h. A CASA – Anexo. Até 22/07. Saiba mais.
4° Prêmio Objeto Brasileiro

Últimos dias para inscrição! O 4º Prêmio Objeto Brasileiro irá destacar projetos que promovem o encontro entre design e artesanato em quatro categorias: Objeto de Produção Autoral, Objeto de Produção Coletiva, Ação Socioambiental e Textos. Os prêmios variam de R$ 1.500,00 a R$ 10.000,00. Acesse o regulamento e inscreva-se aqui.
Renda-se

O museu A CASA apresentará, em 2014, o projeto Renda-se. A iniciativa tem o objetivo de promover o encontro entre estilistas e marcas da moda - como Alexandre Herchcovitch, Cavalera, Marta Medeiros e Ronaldo Fraga - e cinco comunidades rendeiras dos estados do Ceará, Paraíba, Piauí, Santa Catarina e Sergipe. O resultado será exibido em exposição no segundo semestre de 2014. Saiba mais.
www.acasa.org.br
Nova sede do museu A CASA

Acompanhe o andamento da construção da nova sede do museu A CASA. O término das obras está previsto para o segundo semestre de 2014. Veja aqui.
Museu A CASA nas redes sociais

Apoio

|
Entrevista - Angela Mascelani
“A arte rompe com ideias fixas e com padrões repetitivos; arte mobiliza e instaura criação, sempre”
Angela Mascelani é pesquisadora e diretora do Museu Casa do Pontal.

No livro "Caminhos da Arte Popular - Vale do Jequitinhonha" você chega a mencionar que “a arte cerâmica popular produzida no Brasil contemporâneo, no Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais, encanta a todos que a conhecem, toca os sentidos”. Quais as características, valores e manifestações populares que despertam o seu interesse pela produção artística dessa região?
Como eu fui durante muitos anos ao Vale do Jequitinhonha, encontrei muitos contextos diferentes naquela região. Quando fui pela primeira vez, no final da década de 80, comecei a observar que eles faziam muitas coisas decorativas, mas sempre numa interlocução com pessoas de fora, com membros da CODEVALE - Comissão para o Desenvolvimento do Vale do Jequitinhonha, que tinha uma forte atuação na região, por exemplo. A arte toca os sentidos pela beleza. Mas conhecer quem faz esta produção, seus códigos éticos, os valores em vigor nas comunidades, tudo encanta pela generosidade que testemunhamos. Por exemplo, por mais que seja difícil compartilhar a vizinhança – como o é para nós, hoje, moradores das grandes cidades, que sentimos isso como um grande problema – nestas pequenas vilas e povoados as pessoas estão mais próximas, compartilhando e trocando técnicas, informações, vendas e muito mais. O que primeiro me seduziu no Vale do Jequitinhonha, além das próprias criações, foi essa capacidade do trabalho se desenvolver em comunidade, mesmo com a preservação de autorias. Um mundo com forte capacidade para incluir novos participantes. E isso também é encantador porque os mundos de arte, às vezes, têm dificuldade para incluir novos participantes. Eles tendem a ficar mais exclusivos conforme seus participantes tornam-se bem-sucedidos. Em alguns casos, pessoas reconhecidas como grandes artistas nunca mais irão fazer uma oficina com outras pessoas “comuns”, nunca mais vão fazer uma aula numa escola de arte, não vão sequer para a escola em que se formaram... Salvo raras exceções, praticamente não existe essa possibilidade no mundo dito culto; o que é uma pena. Na arte popular isso não é comum, mas é possível. Então, acho que o Vale me permitiu ter acesso a essa vida na qual a dimensão estética cria uma coerência dentro da própria vida. A casa é bonita, embora não tenha água durante uma época do ano. A roça é difícil, mas não é abandonada porque tem uma época em que dará frutos. E não se trata de olhar para este mundo filtrando apenas a beleza. Temos consciência de que estas e outras circunstâncias geraram situações de muitas dificuldades. Porém, ao mesmo tempo, as ceramistas continuam a criar constantemente coisas novas. Isso, na minha visão, é o que caracteriza e diferencia a arte popular brasileira. O elemento diferenciador é essa capacidade inventiva, de sempre ir criando coisas novas.
O Museu Casa do Pontal já idealizou e organizou exposições sobre a arte popular brasileira em 15 países. Na sua visão, como e qual foi a receptividade dos objetos brasileiros no exterior?
Iniciei a atuar como curadora de exposições internacionais se deu há 18 anos. Neste período realizei a curadoria de exposições que fizemos na Argentina, no Paraguai, na França, na Bélgica, em Portugal e na Índia. Vejo que há algo bastante parecido na recepção de nosso acervo, seja onde for. Há um grande interesse pela arte popular. Parece-me que essa receptividade tem a ver com o desejo de saber mais sobre o Brasil, desejo este formado a partir de algumas fantasias sobre o país, visto como um paraíso tropical habitado por um povo talentoso, aberto e acolhedor. Na Argentina e no Paraguai, a atração parece passar pela curiosidade sobre este vizinho grande e enigmático, mas também pela busca de uma identidade comum. Os europeus, por sua parte, devido inclusive a seu passado colonialista, se interessam pelos aspectos mais exóticos, pelas festas, pelas músicas, pela religiosidade sincrética. A música e o futebol também participam da criação de um imaginário um tanto quanto romântico sobre o Brasil. Além disso, ir a exposições e museus é um hábito europeu bastante consolidado. Faz parte da formação cultural que tem início na mais tenra infância. Há um interesse pela geografia do país, por sua vastidão e por conhecer o pensamento deste povo que é resultado de grandes misturas étnicas e culturais.
E no museu, como essa recepção se manifesta?
Quando as pessoas chegam ao Museu Casa do Pontal, elas se deparam com um universo tão rico que “esquecem” quase que instantaneamente o senso comum que associa “povo” com pobreza e “falta”. Ali, pode-se reconfigurar essas ideias. E povo vira sinônimo de potência, força, riqueza e criação. O número impressionante de obras em nossa exposição permanente também impacta. Imagino que Jacques Van de Beuque tenha proposto esta forma expositiva numa época em que era preciso um grande esforço para que as pessoas pudessem livrar-se de estereótipos e ver com os olhos livres a diversidade da produção artística popular. Por incrível que pareça, ainda hoje há os que imaginam que a arte popular é um estilo de arte pernambucana e não conseguem reter o que é evidente: a arte popular demarca apenas e tão somente uma origem socioeconômica e cultural. Não obedece a tamanhos, proporções, materiais, nem estão relacionadas com formas e caracteres específicos. Não se confunde com a arte dita naif. Além disso, existem produtores em Minas Gerais, no Rio de Janeiro, em Santa Catarina, em São Paulo, em toda parte do Brasil. A maior parte da produção artística nasce no efervescente campo do artesanato, mas vai além e ultrapassa os contornos deste campo pois a arte rompe com ideias fixas e com padrões repetitivos. Arte mobiliza e instaura criação, sempre.
Leia entrevista na íntegra
|
Matéria do Mês
A CASA viaja - Sergipe/Alagoas
por Elisa Nazarian

Em Sergipe a caatinga é verde. Pelo menos estava verde nos cinco dias em que estive lá, numa viagem promovida por A CASA museu do objeto brasileiro.
Dizem que, quando a chuva cai, de um dia pro outro ela verdeja. Pra mim, foi um encantamento. Em minha vasta ignorância, nunca tinha parado pra pensar em Sergipe. Fui pra lá sem saber pra onde estava indo. Não sabia que era um estado acidentado, com uma rica topografia e uma luz belíssima. Minha falta de curiosidade foi injusta. Voltei de lá cativada. A viagem feita com A CASA faz com que a gente confirme um outro Brasil: sereno, lindo e afável.
Éramos um grupo de doze mulheres. A ideia era percorrer o artesanato do lugar, com foco nos bordados. Nossa viagem durou cinco dias. Além da capital, estivemos em Poço Redondo, Canindé do São Francisco, Piranhas, Entremontes, Ilha do Ferro, São Cristóvão, Laranjeiras e Divina Pastora. Poço Redondo, Entremontes, Ilha do Ferro, Laranjeiras e Divina Pastora são centros de excelência em renda e bordado.
São Cristóvão era a antiga capital de Sergipe. Por ter um porto tímido, a capital teve que ser mudada pra Aracaju. É uma cidadezinha linda, com belas igrejas, um museu de arte sacra, um pequeno museu histórico e freiras que vendem delícias pra se comer. O guia do museu histórico é um homem que morou certa época no Canadá, mas detesta o frio e voltou pra Sergipe. É politizado e agradavelmente falante. Reclamou que a cidade está entregue às moscas.
Em Sergipe, o Rio São Francisco é limpo e sereno, mas estava baixo. Disse o barqueiro que nos levou até a Ilha do Ferro que baixou há uns dois anos. Não se vê garrafas pet, nem sacos de salgadinhos, nada que agrida a vista, só a natureza se estendendo sem alarde. Tudo muito tranquilo. Fico pensando que só de morar perto desse rio a pessoa já é feliz.
Nos cinco dias que durou nossa viagem, tivemos o apoio de uma van, competentemente dirigida pelo seu Roberto, de infinita paciência. Dirigir com doze mulheres ao pé do ouvido não é coisa pra amador. Ele se saiu muito bem. Conhecia toda a região e nos mostrou o que era um mandacaru, um xiquexique, uma palma. Nunca tinha pressa.
Nossa guia, Eliane Guglielme, também foi ótima. Animadíssima, bem informada, e atenciosa, só tremeu nas bases quando resolvi comprar um móbile de urubu, feito com folha de palmeira. Não quis nem chegar perto. Tem medo até de galinha.
Na volta da Ilha do Ferro, paramos num ponto de venda de doces artesanais. Uma das minhas companheiras de viagem comprou doce de jaca em calda. Garantiu que fica uma delícia refogado no arroz.
No nosso último dia em Aracaju, estivemos no Museu da Gente Sergipana, um museu que festeja a identidade local, muito bem cuidado, interativo. Foi na loja desse museu que encontrei as peças mais interessantes do artesanato e da arte locais, a preço justo.
Já que estávamos em parte da rota percorrida por Lampião, pensei que aproveitaríamos para conhecer a Grota do Angico. Na minha santa ignorância, não sabia que era apenas uma grota. O verdadeiro Angicos fica no Rio Grande do Norte. Quanto à Grota, não fomos. Talvez fique para uma próxima vez.
|
|
A CASA indica
O Brasil na Arte Popular

Com curadoria de Angela Mascelani, a exposição apresenta mais de 400 obras de 51 artistas de 12 estados brasileiros. A mostra traz peças que retratam atividades cotidianas, festivas e imaginárias do povo brasileiro. Até 10/08. De terça a sábado, das 10h às 21h. Domingos, das 10h às 19h. Sesc Belenzinho. Rua Padre Adelino, 1000. Belenzinho. São Paulo-SP. Saiba mais.
Patrimônio Imaterial Brasileiro – A Celebração Viva da Cultura dos Povos

A exposição traz textos, fotos, vídeos, músicas, sons e objetos relacionados com os 29 bens imateriais registrados pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN). O Modo de Fazer Viola-de-Cocho, o Ofício das Paneleiras de Goiabeiras no Espírito Santo e o Modo de fazer Renda Irlandesa são alguns dos bens presentes na mostra. De terça a domingo, das 10h às 21h. Até 20/07. CAIXA Cultural Rio de Janeiro. Av. Almirante Barros 25. Centro (Metrô: Estação Carioca). Saiba mais.
Histórias da Tradição

O projeto apresenta textos, vídeos, fotografias, desenhos e depoimentos contados nas aldeias indígenas pelos narradores tradicionais dos povos Xavante e Karajá. Foram editados dois livros: Ynyxiwè que trouxe o sol e outras histórias do povo Karajá e Aihö’ubuni, O Lobo Guará e outras histórias do povo Xavante. Saiba mais.
Formação da Culinária Brasileira

Com autoria do sociólogo Carlos Alberto Dória, o livro apresenta uma análise dos principais ingredientes, técnicas culinárias e processos sociais que levaram à criação dos hábitos alimentares e pratos nacionais. A obra introduz uma abordagem moderna à comida do Brasil, procurando compreender seus elementos, para além do enfoque étnico ou social. Editora Três Estrelas. 280 páginas. R$29,40. Saiba mais.
Proac - Editais 2014

Estão abertas as inscrições para o Programa de Apoio à Cultura (Proac) do ano de 2014, pela Secretaria de Estado de Cultura de São Paulo. Além do número maior de projetos contemplados, houve um aumento para o apoio a propostas de fora da capital paulista. Os editais abrangem as Artes Cênicas e Festivais de Arte, além de criar bases para a preservação e difusão de acervos museológicos. Saiba mais.
Boa
leitura
Os bordados oferecem uma narrativa sobre os papeis sociais e sobre a ocupação do território, ao mesmo tempo que acrescentam novas leituras das terras seridoenses pela estética da ornamentação dos tecidos, no qual emerge uma narrativa que apazigua a terra árida, a geografia difícil, o trabalho árduo, a luta entre o selvagem e o processo de colonização. Ao perscrutar as pegadas de mulheres de Caicó e de seus bordados é possível se aproximar de relações que se tangenciam pela prática artesanal e por seus artefatos que guardam, em si, significados sociais que se projetam nas coisas uma série de atributos, principalmente, no que tange às concepções de gênero. Bordar é uma atividade que envolve processos de aprendizado, disciplina o corpo, domínio de técnicas e de repertórios, criação de vínculos, construindo uma forma de estar e de ver o mundo. Os bordados apresentam o prazer da beleza, revelam um novo olhar frente às imagens de miséria e de confinamento que cercam o imaginário do sertão nordestino. Mais do que uma saída econômica ou uma política específica para o desenvolvimento regional, trata-se de uma experiência estética da comunidade seridoense que mobiliza relações sociais, tangenciadas pela produção artesanal. O bordado é uma narrativa. E como uma narrativa, guarda, em si, outras narrativas que o compõem.
Thaís Fernanda Salves de Brito
Narrativas, repertórios e aprendizado: bordados e bordadeiras
Leia o texto na íntegra
|