Editorial
Desde a segunda metade do século XX, modelos de proteção jurídica para a salvaguarda do patrimônio cultural imaterial têm sido desenvolvidos em diversos países do mundo. Valendo-se deste processo, a 85ª edição da newsletter aborda alguns dos sistemas de Tesouros Humanos Vivos criados ao longo das últimas décadas. Confira em Matéria do Mês.
Já em Entrevista, a escritora e empreendedora colombiana Marcella Echavarria fala sobre sua atuação nas áreas cultural e social e apresenta alguns de seus trabalhos desenvolvidos em países da América Latina e Ásia.
E aproveite: estes são os últimos dias para conferir as exposições RENDA-SE e Girando o Acervo IV.
Acontece
no
museu A CASA
Pedroso de Morais, 1216
RENDA-SE

Exposição reúne looks desenvolvidos a partir do encontro entre estilistas e marcas da moda - como Amapô, André Lima, Huis Clos e Walter Rodrigues - e comunidades rendeiras dos estados do Ceará, Paraíba, Piauí, Santa Catarina e Sergipe. O projeto é uma realização de A CASA e conta com a curadoria de Dudu Bertholini., De terça a domingo, das 11h às 19h. Até 28/06. Saiba mais.
Pedroso de Morais, 1234
A CASA - Anexo
Girando o Acervo IV

A CASA apresenta uma nova seleção de peças de seu acervo. A bolsa Lagoa dos Patos da Colônia de Pescadores São Pedro Z-3 e a echarpe Memória da Paraíba de Renato Imbroisi e do Clube de Mães de Camalaú são alguns dos destaques da mostra. De segunda a sexta, das 10h às 19h. A CASA – Anexo. Até 26/06. Saiba mais.
www.acasa.org.br
Coleção Sérgio J. Matos

Coleção virtual reúne cadeiras, bancos, luminárias, poltronas, vasos e mesas desenvolvidas pelo designer Sérgio J. Matos. Veja aqui.
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Apoio

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Entrevista - Marcella Echavarria
"O artesanato latino americano é tão diverso quanto cada um dos países da região"
Marcella Echavarria é escritora, editora, fotógrafa e empreendedora das áreas cultural e social.

Conte-nos um pouco de sua trajetória.
Desde criança eu me interessava por todo o trabalho que fosse realizado com as mãos. À medida em que fui crescendo, descobri os artesãos e me interessei em aprender talha em madeira, batik, vitrais e joalheria. Quando comecei a pensar na universidade que iria cursar, acreditava que seria na área de arte, mas chegado o momento da decisão final, uma pergunta de minha mãe mudou o meu rumo. Ela me perguntou: "Como artista, que história você irá contar?". Resolvi ir então para a Brown University, onde me dediquei obsessivamente a descobrir o que outras pessoas haviam dito e como contavam suas histórias na literatura. Terminado o curso e de volta à Colômbia, fui atraída para o mundo editorial, pois achava que era preciso contar histórias de artesãos, de pessoas que tinham construído suas vidas com o trabalho feito à mão. A pergunta era sempre a mesma: “Como contar essas histórias moldadas por texturas e objetos, sem mostrá-los?”. E esse era o problema, pois muitos artesãos já tinham mudado de ofício e dessa herança restavam apenas lembranças. Como o assunto me interessava tanto, comecei a trabalhar com alguns artesãos individualmente, procurando um meio de patrociná-los para que voltassem a trabalhar. Um dia, viajando por Catacaos, no Peru, pensei: como era possível que essas tradições milenares estivessem se perdendo e ninguém fizesse nada? Resolvi, portanto, mandar alguns e-mails e recebi da equipe de Donna Karan um convite para visitar os escritórios da marca em Nova York. E lá estava eu, em pleno Fashion District, diante de uma mesa cheia de amostras e peças artesanais maravilhosas que eu tinha enfiado de última hora na mala. Quando a Donna Karan passou pela sala, ali mesmo ela me disse que iria lançar minha empresa - e assim nasceu a SURevolution, um projeto que durou até 2010. Foi um marco em Nova York. A presença do artesanato de alta qualidade em lojas ícones como Barneys, Takashima e em revistas como Vogue, Vanity Fair, Architectural Digest, Wall Paper e Domino abriu um universo imenso de possibilidades para o mundo artesanal sob esse novo foco de excelência.
Como é a relação entre design e artesanato na América Latina?
O artesanato latino americano é tão diverso quanto cada um dos países da região. O artesanato indígena é tão peculiar que praticamente se mantém fechado nos seus códigos milenares e o seu conhecimento e apreciação ficam restritos aos museus e colecionadores sofisticados. O artesanato rural e urbano sofreu muitas intervenções do design industrial e os resultados disso foram mistos, pois há muita confusão entre linguagens, intenções e formas.
Quais são as principais dificuldades para o crescimento do artesanato nos países não desenvolvidos ou em desenvolvimento, como Brasil, Colômbia e Peru?
Há muitos desafios. O principal deles somos nós mesmos, pois não se dá real valor ao que é próprio de cada povo, nem há uma apreciação sincera pelo artesanato. Em geral, nos nossos países se dá mais valor ao que vem de fora, ao que é industrializado, produzido em massa. Se houvesse realmente essa valorização, haveria investimento privado e público, haveriam políticas para o setor, estratégias coerentes. Muitas vezes o artesanato é visto como o patinho feio, como um setor que ninguém sabe bem onde situar. O artesanato ocupa um espaço confuso, em um momento também de muita confusão e velocidade.
Leia entrevista na íntegra
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Matéria do Mês
As Leis de Tesouros Humanos Vivos numa perspectiva global
por Ivan Vieira
As "Leis de Tesouros Humanos Vivos", também conhecidas como “Leis de Mestres” ou "Leis de Patrimônio Vivo", surgiram na segunda metade do século XX após a preocupação de alguns países com o fenômeno de desaparecimento de habilidades específicas de suas próprias culturas. Tais projetos buscavam, sobretudo, o reconhecimento formal de indivíduos portadores do patrimônio cultural imaterial por meio da criação de políticas nacionais de transmissão dos saberes e fazeres da cultura tradicional.
Um dos primeiros projetos de proteção jurídica para a salvaguarda do patrimônio cultural imaterial foi estabelecido no Japão, em 1950, com a aprovação da "Lei Japonesa para a Proteção das Propriedades Culturais". O sistema que esta lei estabeleceu baseava-se no princípio de que a proteção do patrimônio cultural (tanto material como imaterial) era uma responsabilidade do Estado e que, portanto, instituições do governo deveriam elaborar processos para selecionar, proteger e valorizar grupos ou indivíduos com notáveis habilidades e/ou conhecimentos sobre o patrimônio cultural nacional.
Em 1962, a República da Coreia (ou Coreia do Sul) criou o seu programa nacional para a proteção dos bens culturais. Segundo Keith Howard, professor da Escola de Estudos Orientais da Universidade de Londres, a República da Coreia "seguiu, em grande parte, a legislação japonesa, mas por diferentes razões: para o país tornava-se necessário promover uma cultura nacional, após séculos de soberania chinesa, 35 anos de colonialismo japonês e, em seguida, o rápido processo de ocidentalização que atingia inúmeros países asiáticos". Após a implementação dos projetos no Japão e na República da Coreia, Tailândia, Filipinas e França desenvolveram programas nacionais para a proteção dos portadores de conhecimentos do patrimônio cultural imaterial. Desde 1993, Romênia, República Tcheca, Nigéria e Senegal também aprovaram legislações para estabelecer seus próprios sistemas.
Na década de 1990, a UNESCO elaborou seu modelo de "Tesouros Humanos Vivos", com o objetivo de que cada país implementasse um programa de valorização de mestres de diferentes ofícios.
No documento Diretrizes para o Estabelecimento de Tesouros Humanos Vivos, a UNESCO define os Tesouros Humanos Vivos como indivíduos que possuem "os conhecimentos e as habilidades necessárias para executar ou recriar elementos específicos do patrimônio cultural imaterial". De acordo com o mesmo documento, a criação do sistema torna-se necessário dado que "o patrimônio cultural imaterial é inerentemente vulnerável devido à sua natureza não-física. A sua preservação, promoção, divulgação e revitalização são, portanto, de extrema urgência".
Após a Convenção para a Salvaguarda do Património Cultural Imaterial, realizada em 2003, inúmeras iniciativas que seguem as diretrizes da UNESCO têm sido desenvolvidas em países como Angola, Burkina Faso, Cabo Verde, Egito, Madagascar, Mali, Myanmar, Mongólia e Vietnã.
No contexto latino americano, o Chile, em 2010, criou seu programa nacional de Tesouros Humanos Vivos com a Resolução nº 2656. Segundo o Conselho Nacional da Cultura e das Artes do país, o programa premia, anualmente, 3 indivíduos e 3 comunidades que são “portadores de conhecimentos, expressões e/ou técnicas arraigadas nas tradições culturais representativas de uma comunidade ou grupo determinado”. Dominga Neculmán e a União de Artesãs de Quinchamalí são exemplos de indivíduos/grupos reconhecidos pelo programa.
No Brasil, conforme divulgado pelo museu A CASA em novembro de 2012, o sistema Tesouros Humanos Vivos ainda não foi implementado no âmbito federal. Entretanto, o Plano Nacional de Cultura, de 02 de dezembro de 2010, coloca entre suas estratégias e ações o reconhecimento da "atividade profissional dos mestres de ofícios por meio do título de 'notório saber'" e o estabelecimento de “leis específicas” e “bolsas de auxílio”. Atualmente, apenas estados como Ceará, Pernambuco, Rio Grande do Norte, Alagoas e Bahia possuem políticas locais de reconhecimento e valorização de mestres.
Leia a matéria na íntegra
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A CASA indica
Fenearte

A Feira Nacional de Negócios do Artesanato (Fenearte) é a maior do segmento na América Latina e reúne cultura, gastronomia, moda, decoração, música e artesãos de Pernambuco, do Brasil e de mais 35 países. Em sua 16ª edição, o evento terá dois homenageados: Louro do Pajeú e Mestre Nuca de Tracunhaém. De 02 a 12/07. Centro de Convenções de Pernambuco. Av. Professor Andrade Bezerra, s/n. Salgadinho. Olinda-PE. Saiba mais.
Nesta edição, no dia 03/07, às 17h, Renata Mellão, diretora do museu A CASA, ministrará uma palestra no Espaço Janete Costa.
Coleção Cangaço

Em homenagem ao fenômeno social do sertão nordestino brasileiro, a coleção Cangaço apresenta objetos desenvolvidos pelos designers Fernando e Humberto Campana em parceria com o mestre artesão Espedito Seleiro. Composta por seis peças - cadeira, armário, poltrona, sofá, espelho e estante - a coleção emprega couro e palha como matérias-primas predominantes. Até 27/06. De segunda a sexta, das 10h às 19h. Sábados, das 10h às 14h. Firma Casa. Al. Gabriel Monteiro da Silva, 1487. São Paulo-SP. Saiba mais.
Sobre a arte brasileira

Organizado por Fabiana Werneck Barcinski, o livro apresenta ao público um panorama da arte produzida no Brasil desde a Pré-História até o final da década de 1960. A obra reúne textos de 11 especialistas entre historiadores, sociólogos e arqueólogos. O último capítulo, escrito por Ricardo Gomes Lima, oferece uma reflexão sobre a arte popular brasileira. Editora Martins Fontes. 368 páginas. R$128. Saiba mais.
Prêmio ECOERA

Idealizado por Chiara Gadaleta, o Prêmio ECOERA pretende apontar um caminho rumo à sustentabilidade para as empresas do mercado da moda e beleza. A iniciativa, desenvolvida em parceria com o Sistema B, busca ajudar consumidores a identificar e escolher empresas que associam a geração de lucro à soluções para problemas sociais e ambientais. A apresentação do Prêmio acontecerá no dia 10/06, a partir das 11h, na Casa Solimene - Rua Januário Miraglia, 128, Vila Nova Conceição, São Paulo-SP. As inscrições estarão abertas a partir do dia 01/07 e a cerimônia de premiação ocorrerá em dezembro de 2015. Saiba mais.
Boa
leitura
O estudo do design como atividade profissional é recente. As primeiras reflexões sobre a atividade remontam a 1920, ainda que tais estudos somente foram ganhando corpo mais recentemente. Tal processo é marcado por esforços deliberados empreendidos no âmbito acadêmico e em meio às práticas profissionais. Como aconteceu com muitas outras áreas em formação, essa força conjunta ocupou-se da tarefa de delimitar as abrangências da área, de identificar as práticas profissionais daqueles que se destacavam na época, de determinar os papéis e as competências desses profissionais, para assim distinguir a atividade de outras que lhe fossem próximas. Não nos causará estranhamento, portanto, a constatação de que os primeiros ensaios sobre design procuravam descrever diligentemente um conjunto de ‘normas e restrições’ que deixassem claro ‘o que era design’ e ‘quem era designer’.
Celso Carnos Scaletsky, Débora Azevedo, Guilherme Corrêa Meyer e Guilherme Vaccaro
Imagem social do design: um estudo sobre como designers e não designers descrevem o design
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