A Ver as Ervas – Associação das Erveiras e dos Erveiros do Ver-o-Peso – é uma organização sem fins lucrativos, criada em 2006, que reúne 102 erveiros do tradicional mercado do Ver-o-Peso, em Belém, Pará.
Sobrevivendo a partir da venda de ervas para uso terapêutico e místico – sob a forma de perfumes, pomadas, sabonetes, dentre outros produtos – os erveiros e erveiras são verdadeiros guardiões dos costumes tradicionais dos povos da Amazônia. O ritmo do mundo moderno leva ao enfraquecimento das tradições e ameaça sua subsistência.
O grande desafio é a busca da sustentabilidade da associação sem a perda de sua identidade, garantindo melhores condições de emprego e renda para os erveiros e suas famílias, uma comunidade superior a 500 pessoas que luta para conservar sua cultura e seus conhecimentos sobre a biodiversidade da Amazônia.
O Design participativo
Convidadas para a realização do projeto de identidade Visual para a Associação Ver-as-Ervas, as designers Fernanda Martins e Sâmia Batista, do escritório Mapinguari design, desenvolveram uma metodologia que une a prática tradicional do Design à um processo participativo.
A metodologia valoriza a realidade dos grupos e estimula o uso de referências provenientes do seu próprio universo, diferente do que normalmente ocorre em processos tradicionais de design gráfico, onde o repertório do designer influencia sobremaneira nos resultados.
Neste projeto, o design gráfico figura também como um agente de transformação econômico-social, ao propor um novo modelo de cadeia de valor, respeitando o saber e o fazer tradicional e sugerindo novas soluções para velhos problemas.
Desta forma além das vantagens conhecidas obtidas com o desenvolvimento de uma identidade visual forte, pertinente e atualizada unem-se as obtidas através do processo participativo, tais como:
• Ampliação do auto-conhecimento e do reconhecimento de sua atividade;
• Resgate de auto estima;
• Maior integração entre os participantes;
• Aumento da criatiidade;
• Maior acesso ao mercado e à participação econômica;
• Fortalecimento institucional.
Utilizando referências simbólicas provenientes da própria comunidade, foram delinadas soluções em conjunto com os erveiros. As soluções propostas procuraram valorizar o conhecimento tradicional, ajudando a aumentar a renda de forma sustentável, respeitando o fazer artesanal de comunidades, a fim de solucionar questões como pobreza e baixa auto-estima.
Situação encontrada
A associação passava por um momento novo de planejamento para a aquisição de uma sede e de sua formalização.
O trabalho realizado iniciou com uma análise do sistema de produção e vendas no Ver-o-Peso, com pesquisas sobre seu público, concorrentes, pontos fortes e fracos no momento presente.
O diagnóstico apresentou problemas de infra-estrutura, segurança e higiene; imaturidade associativa, desperdício de matéria-prima e um fraco canal de vendas.
A queda gradativa das vendas é causada principalmente pela substituição de hábitos relacionados ao uso de produtos artesanais tradicionais.
Soluções propostas
A demanda principal dos erveiros era um espaço para a fabricação e estoque de seus produtos. No mercado, cada erveiro possui apenas uma pequena área para a produção e comercialização.
Através da utilização otimizada e planejada da nova sede, onde foi criado não só um espaço para fabricação e armazenamento, como também salas para oficinas de capacitação, administração e atividades associativas.
Além disso, através da análise da atuação dos erveiros e seus desejos, foram propostas oficinas para produção de itens de uso cotidiano que também podem ser comercializados externamente, tornando-se uma nova fonte de renda, não só para os associados como também para seus dependentes. Ganha a associação, ganha o associado e também seus familiares.
As oficinas propostas:
• Costura: geração de material de uso interno como aventais, sacolas, camisetas.
• Serigrafia: impressão de embalagens, papéis de embrulho e camisetas.
• Reciclagem: visando o aproveitamento de resíduos que usualmente iriam para o lixo, no próprio Ver-o-Peso, e também utilização dos resíduos das plantas utilizadas para a fabricação dos produtos. O objetivo é a utilização de 100% dos resíduos provenientes da atividade.
• Embalagem: aperfeiçoamento das embalagens utilizadas e desenvolvimento de kits para ampliação das vendas.
• Informática: inclusão digital, suporte para comunicação, geração de originais para serigrafia e criação de embalagens.
O novo espaço permite produzir o produto com melhor qualidade em termos de fabricação. Através das mesmas atividades do dia-a-dia do erveiro, procurou-se soluções para a geração de renda e valorização do seu fazer propondo criativamente um novo sistema de produto-serviço.
Conclusão
O processo de design com metodologia participativa possibilitou aos erveiros um maior reconhecimento d valorização de suas atividades e de seus saberes, qualificando-os para estar inseridos na economia global e empoderando-os para serem agentes de seu futuro. Esse reconhecimento possibilitou a internalização pelos erveiros, de conceitos levantados sobre a associação durante o processo participativo. Esses conceitos atualmente são repassados aos seus clientes de uma forma segura e efetiva.
Do ponto de vista dos designers, o design participativo é bastante positivo pois apresenta-se como uma maneira de propiciar melhor acesso ao mercado e assim melhorar a participação econômica das comunidades. Mais do que projetar a identidade visual para consolidação de uma imagem, o design gráfico também ajuda no reconhecimento da identidade do próprio grupo, pelos seus integrantes.