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Figura 01: tsurus elaborados com papéis colors – Acervo dos autores





ARTIGO

RECICLAGEM ARTESANAL DO PAPEL: INCORPORANDO O DESIGN SUSTENTÁVEL NO AGRESTE PERNAMBUCANO

Publicado por A CASA em 5 de Junho de 2014
Por Márcio Cleyton Vasconcelos Barbosa , Pedro Henrique Gomes dos Santos , Elaine Jackielle Vieira Cordeiro , Emilio Augusto G. de Oliveira e Manoel Guedes Alcoforado

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Recycling Paper Craft: Incorporating the Design Sustainable Rural Pernambuco

Resumo
As práticas sustentáveis são fundamentais à estabilidade da vida. O design, portanto, tem o papel de analisar e intervir nos processos projetuais, conferindo eficiência ecológica ao ciclo de vida dos produtos. Logo, com vistas a auxiliar nos métodos de preservação ambiental, o presente artigo relata os resultados promovidos por uma ação interventiva realizada no CEPMMM - Centro de Educação Popular Maria Mãe de Misericórdia. Nesta, o processo de reciclagem artesanal do papel, somado à técnica do origami já utilizada pela comunidade, pôde ser incorporado às atividades do grupo, intencionando atingir os pilares ambientais, econômicos e sociais, que regem a sustentabilidade.

Palavras Chave: Design; Sustentabilidade; Reciclagem.

Abstract
Sustainable practices are essential to the stability of life. The design therefore has a role analyze and intervene in the projective, giving eco-efficiency to the life cycle of products. Therefore in order to aid in the methods of environmental preservation, this paper reports the results promoted by an action in interventional CEPMMM – Centre for Popular Education Mary Mother of Mercy. In the recycling process handmade paper, plus the technique already used by the origami community, can be incorporated into the activities of the group, intending to reach the pillars environmental, economic and social sustainability governing.

Keywords: Design; Sustainability; Recycling.

Introdução

A crescente dinâmica produtiva, que assola nossos dias, direciona o mercado global à produção, cada vez maior, de bens de consumo. Estes, em sua maioria, não são planejados a fim de promover algum tipo de minimização de impactos ao meio ambiente, e, por sua vez, produzem um volume de resíduos que assume proporções alarmantes a cada dia.
É fato que, muito do que se é consumido hoje pode ser direcionado a algum tipo de reciclagem, atribuindo, portanto, aos dejetos, novas possibilidades de utilização. E fazendo uma análise nesta perspectiva, é notória a constatação de que grande parte das empresas inseridas no mercado pode ser fonte geradora de matéria-prima reutilizável, na medida em que materiais como o papel, tão indispensável à grande parte das atividades contemporâneas, pode ser voltado à propostas de reuso, visto que, proporcionalmente ao consumo elevado que apresenta, também se tem um grande descarte do mesmo.
Logo, enfocando-se em um panorama sustentável, é possível atribuir aos rejeitos do papel uma valorização, como na possibilidade de reaproveitamento para produção de artefatos artesanais que, além de propiciarem benefícios ecológicos de preservação ambiental, podem garantir as famílias e comunidades carentes uma nova fonte de renda e sustento. Segundo Kazazian (2005), a valorização dentre os outros aspectos designa toda etapa de tratamento que dá lugar à reutilização do produto ou de um de seus componentes.
Tendo em vista tais propósitos, o presente artigo visa à exposição da aplicação e dos resultados de um plano para reuso dos rejeitos de uma Instituição Pública do interior pernambucano, que detêm alta demanda de descarte de papel. Este será direcionado como proposta de fonte de renda à comunidade religiosa CEPMMM, dirigida pelas Irmãs Maristas, localizada na cidade de Caruaru, através de estratégias do design sustentável que interfiram positivamente em seus aspectos ambientais, econômicos e sociais. “[...] restam duas possibilidades: buscar reduzir a geração de resíduos ou buscar alternativas economicamente viáveis para reutilizar e/ou reciclar este rejeitos” (RIBEIRO E MORELLI, 2009, p.59).
A ação interventiva se propõe a instruir os participantes da comunidade acerca de processos de reciclagem artesanal do papel, incorporando a técnica do origami já dominada pelo grupo, a fim de propiciar a confecção de caixas para embalagem de presentes.

As práticas sustentáveis e o ecodesign

A atividade projetual da atualidade volta-se mais comumente para as intenções
econômicas do mercado, “empresas precisam introduzir continuamente novos produtos, para impedir que empresas mais agressivas acabem abocanhando parte de seu mercado” (BAXTER, 1998). Neste meio competitivo, a sustentabilidade ambiental se coloca como objeto de discussão e polêmica. Enquanto que uma parcela da sociedade se habilita a investigar e realizar práticas que visam uma minimização considerável dos impactos promovidos pelo consumo e produção intensos, outro grupo significativo se coloca como indiferente às agressões exercidas ao meio ambiente, esquecendo-se de que a preservação dos bens naturais é necessária à conservação da vida.
Manzini e Vezzoli definem a sustentabilidade ambiental como:

[...] condições sistêmicas segundo as quais, em nível regional e planetário, as atividades humanas não devem interferir nos ciclos naturais em que se baseia tudo o que resiliência do planeta e, ao mesmo tempo, não devem empobrecer seu capital natural, que será transmitido às gerações futuras. (p. 27, 2005)

Para os autores, que retratam ainda a sustentabilidade como um objetivo a ser atingido, “a nossa sociedade depende do funcionamento a longo prazo daquele intricado de ecossistemas que se chama natureza. Isto é, da sua qualidade e da sua capacidade produtiva” (MANZINI E VEZZOLI, 2005).
Diante dos alertas dados pelo meio ambiente, o direcionamento a práticas que incentivem a preservação dos bens naturais se torna imprescindível, instigando assim diversos campos da sociedade a atuarem eficazmente, utilizando-se de meios que propiciem relações sustentáveis entre homem e meio ambiente.
Para isto, Kazazian (2003) aponta que “vários especialistas concordam em considerar a educação a principal ferramenta para o despertar da consciência ambiental.” Levando a crer que, para a consolidação de uma conscientização ecológica estruturada, é necessário se tratar das bases do sujeito, no sentido de trazer ao mesmo uma sensibilidade tal que gere um ser responsável no âmbito ambiental. Porém, o autor enfatiza que este processo de conscientização é demorado, e atitudes ecologicamente corretas são necessárias de forma emergencial, visto que “o ritmo da Terra em seus processos de regeneração se estende em milhões de anos”. Logo, atitudes inconseqüentes do ponto de vista ecológico que, muitas vezes realizadas em frações de segundo, podem ter efeitos que durem um longo período de tempo até serem sanados.
Neste contexto, a atividade do design, tratada por Löbach (2001) como sendo “[...] um plano para a solução de um problema determinado”. Assume, portanto, a responsabilidade de trazer à sua área de atuação aspectos de natureza sustentável, tendo o papel de idealizar soluções projetuais que vislumbrem aspectos de redução dos impactos ambientais. Pode, desta forma, participar como agente operante e direto na solução de um problema maior, que, portanto, não atinge apenas uma parcela da sociedade, mas sim, a humanidade como um todo.
O design pode, para isso, conectar o que é tecnicamente possível ao ecologicamente necessário, com vistas a desenvolver novas propostas que sejam social e culturalmente apreciáveis e que gerem produtos limpos. (MANZZINE E VEZOLI, 2002). Os autores apresentam, ainda, quatro níveis de interferência da atividade do design com vistas à redução de impactos ambientais:
- O redesign ambiental do existente;
- O projeto de novos produtos ou serviços que substituam os atuais;
- O projeto de novos produtos-serviços intrinsecamente sustentáveis;
- A proposta de novos cenários que correspondam ao estilo de vida sustentável.
Para alcançar, portanto, um patamar que permeie uma relação sustentável com o meio ambiente, é necessário avaliar e planejar o ciclo de vida do produto. Para Kazazian (2003):

Cada uma das etapas da vida do produto gera inputs e outputs que terão impactos sobre o meio ambiente. Essas etapas devem ser analisadas desde a concepção do produto, porque cada uma contém um potencial de otimização ambiental: na escolha das matérias-primas, das tecnologias e dos processos de fabricação, na organização da logística; em seguida, no contexto de um uso aprimorado e da valorização final do produto.

Sobre isso, Manzini e Vezzoli (2005) relatam que o Ciclo de Vida do Produto, ou Lyfe Cicle Design, objetiva criar uma ideia sistêmica, em que o impacto das emissões e refugos e inputs dos materiais e energia sejam minimizados no máximo possível, afetando de forma significativa a perniciosidade dos efeitos. Os teóricos apresentam algumas estratégias com vistas a alcançar requisitos ambientais no projeto de artefatos:
1 – Minimização dos recursos;
2 – Escolha de recursos e processos de baixo impacto ambiental;
3 – Otimização da vida dos produtos;
4 – Extensão da vida dos materiais;
5 – Facilidade de desmontagem.
Dentre as estratégias apresentadas, podemos aqui, enfocar o quarto item, que prioriza uma valorização ou reaplicação dos materiais rejeitados. Nisto, o processo de reciclagem se enquadra, como sendo agente extensor da durabilidade dos materiais que compõem o artefato.
A reciclagem pode ser definida como o reprocessamento de materiais intencionando a reutilização industrial dos mesmos. A prática evita de forma substancial o impacto provocado pelo despejo dos materiais no ambiente que, tem então a possibilidade de ser re-encaminhado ao uso.
Enfim, todas as práticas que visem atribuir aspectos sustentáveis nas relações do ser humano com o ambiente são válidas, diante da atual situação do planeta. O encaminhamento ao mercado de artefatos eco-eficientes é, certamente, uma ferramenta de natureza fundamental à meta de incutir na sociedade uma consciência ambiental satisfatória.

O papel e a arte do origami

Desde a pré-história, o homem primitivo já dava indícios da necessidade de um suporte para o registro de suas experiências que, naquela época, se dava em paredes de cavernas e rochas (BAER, 2005). Hoje, o suporte para registros que utilizamos massivamente é o papel.
Para a fabricação do papel é utilizado celulose extraída de árvores como o eucalipto.
Segundo dados da Associação Brasileira de Celulose e Papel – BRACELPA – o Brasil se coloca, hoje, com grande destaque na produção de papel, sendo condecorado nos últimos anos, como o 9º produtor mundial deste material (Tabela 01), tendo em 2010 um volume de cerca de 9,8 milhões de toneladas do produto. Hoje, o papel se coloca como artefato de grande importância para a pauta das exportações brasileiras, sendo fornecido para países da América Latina, União Européia e América do Norte.
O papel é, em grande parte, proveniente de matéria-prima renovável, gerada a partir de florestas cultivadas e certificadas, e, seu período de absorção pela natureza é curto – 3 meses a anos – se comparado a outros materiais como o metal e o plástico e, embora sua deterioração seja rápida, ele é descartado em grades volumes. De acordo com Peltier e Saporta (2009) o índice de reaproveitamento de embalagens de papel e papelão chega, hoje em dia, no Brasil, a mais de 54%, sendo, aproximadamente não reutilizado, de nenhuma forma, o que equivale a pouco mais da metade de todo o papel produzido no país - 4.508 toneladas de papel – anualmente.
A BRACELPA revela, ainda, que a otimização de vida útil do papel, proporcionada por seu reaproveitamento “envolve uma cadeia que começa na separação dos resíduos sólidos, passando pela coleta, triagem e preparação do material recolhido que, em seguida, é encaminhado à indústria para que seja transformado em nova matéria-prima”, desta forma, a reutilização ou reciclagem desse material torna-se imprescindível na contemporaneidade, devido a diversos fatores como, a título de exemplo, o alto nível de utilização de produtos químicos para seu branqueamento ou pigmentação, o elevado consumo de energia para sua produção, ou a quantidade de água que se demanda para fabricação do papel.
A utilização do papel pode ser direcionada a inúmeros fins. Dentre eles, é possível destacar a técnica onde através da dobradura, é possível reproduzir diversos elementos com formas tridimensionais. Esta, desenvolvida pelos chineses, e mais tarde aperfeiçoada pelos japoneses, foi chamada de origami. Aos poucos, a prática se espalhou pela Ásia e Oriente
Médio, chegando a Europa por volta de 1150. Segundo Tanure e Okimoto (2006) “no Brasil, a introdução da arte da dobradura se deve aos colonizadores portugueses, e também à vinda, durante o Império, de preceptores europeus”.
O termo origami significa “dobrar papel”e a técnica se resume em atribuir a um quadrado perfeito de papel, um formato que, geralmente tem inspiração em elementos da natureza, como animais e flores (Figura 01).
Hoje, percebe-se a existência uma variedade de tipos de origami, que se desenvolveram a partir de variações da técnica tradicional. Dentre estas, pode-se destacar o origami modular, o kasudama, o kirigami, entre outros. Cada um, por sua vez, é direcionado à um método específico de dobradura ou encaixe das formas.
Esta técnica criativa de dobradura de papel é um elemento que possui bastante importância em algumas localidades, como no Japão, ao ponto de pessoas que recebem um origami como presente, sentirem-se extremamente gratas devido à carga de valores simbólicos que esses artefatos carregam.

O centro de educação popular e as irmãs maristas

As Irmãs Maristas fazem parte de um grupo religioso vinculado a Igreja Católica que surgiu por volta de 1817, durante a revolução francesa, um período de altos índices negativos no sistema educacional da França. Esta sociedade religiosa originou-se com o intuito de levar o ensino fundamental para as crianças, assim como para disseminar conhecimentos práticos nas comunidades sobre os temas dominados pelos integrantes do grupo das Maristas, onde tais atividades eram e ainda são de cunho voluntário.
Com o passar dos anos, essa fraternidade expandiu-se por toda França e por outros países, com registro de chegada no Brasil em torno de 1897 no Sudeste do país, mais especificamente no estado de Minas Gerais. A partir daí, as Maristas se multiplicaram por todas as regiões do país, exercendo um trabalho que promove crescimento pessoal, educacional, profissional e espiritual dos indivíduos de comunidades de baixa renda.
Atualmente, as Maristas atuam em todos os estados do Brasil e atendem a mais de 280.000 pessoas, somando aproximadamente 24.000 voluntários.
Na cidade de Caruaru, atuam através de irmãs (Figura 02) que auxiliam crianças, jovens e adultos da comunidade no bairro São João da Escócia, na formação educacional e profissional dos envolvidos.
Dentre as principais atividades desenvolvidas pelo Centro de Educação Popular Maria Mãe de Misericórdia está a formação escolar infantil – ensino fundamental –, os cursos e capacitações profissionais e as oficinas de formação complementar. O centro funciona e se mantém através de doações de iniciativa individual ou de empresas, que vão desde contribuições financeiras, até o compartilhamento de conhecimento ou trabalhos voluntários para o bom adamento das atividades desenvolvidas pelas irmãs.

A ação interventiva: confeccionando caixas com papel reciclado e origami

O design, mais que uma atividade direcionada ao consumo capitalista, tem o papel de atuar na sociedade, promovendo, através de inovações projetuais, melhorias na vida dos sujeitos. Costa e Lyra (2011) defendem que:

Em um contexto mais contemporâneo, o design tem sido aplicado na geração de ideias e ações que auxiliem no desenvolvimento social, seja através do uso mais consciente dos recursos do meio ambiente, seja pela conscientização pelo produtor do processo de desenvolvimento produtivo. O designer, nesses processos, deve atuar também como catalisador processual e agregador. Com seu papel na maioria das vezes linear, o design deve flexibilizar-se de que o resultado final será uma variante de sua intenção, e de que a comunidade deve obsorver as propostas no seu tempo.

O design social, por sua vez, se coloca como uma vertente do design que intenciona a concepção de produtos voltados para a contribuição social, contrário aos projetos da indústria de consumo “[...] o desenho industrial costuma ser mais honesto, leal, ético, respeitando as diferenças (sociais, étnicas, raciais, culturais e econômicas); e comprometido com as reais necessidades materiais de uma sociedade quando comparado ao projeto voltado para o consumismo[...]” (SILVA, 2009, p.09).
Logo, observando-se a relevância da atividade projetual direcionada ao design social com vistas a atingir resultados benéficos no âmbito da sustentabilidade ambiental, foi realizado por discentes da Universidade Federal de Pernambuco, um projeto de intervenção que se propôs a desenvolver habilidades práticas nos integrantes do Centro de Assistência Irmãs Maristas, sediado na cidade de Caruaru-PE. A ação intencionou promover o reuso de resíduos sólidos produzidos por uma instituição pública da região.
A priori, foram realizadas visitas à instituição, com a finalidade de promover uma maior aproximação com a mesma. A partir daí, foi possível analisar as particularidades da comunidade carente, onde, de antemão, foi identificada uma intimidade já existente com atividades que se utilizam do papel como recurso para a execução dos trabalhos. Com ele, a técnica oriental do origami é trabalhada por todas as faixas etárias atendidas pelo órgão filantrópico. Através desta técnica, são confeccionados artefatos carregados de aspectos de natureza artística, que se traduzem em bijuterias e cartões religiosos, entre outros.
Monteiro apud Manzini (2008) aponta duas modalidades de ação da atividade do
designer em uma atmosfera de inovação social na comunidade: “(1) Design in designing networks: quando o papel do designer é promover e facilitar um processo de co-design específico contribuindo para facilitar a convergência em torno de idéias compartilhadas e soluções potenciais; (2) Design for designing networks quando o papel do designer é criar condições para estimular, desenvolver e regenerar a habilidade e a competência dos que vão utilizar um “sistema habilitador”.
Nessas condições, o Design for designing networks, pôde ser aplicado na comunidade que, na incorporação das novas propostas apresentadas, objetivou-se, continuar fazendo uso do papel, porém, atribuindo a ele outros direcionamentos. Houve, contudo, um interesse do grupo por tratar de aspectos que aprimorassem o trabalho já realizado por eles, logo, toda a comunidade se manteve aberta à inserção do novo em suas práticas corriqueiras.
Para tanto, foi desenvolvido uma série de caixas decorativas, confeccionadas com o uso de papel reciclado artesanalmente. A matéria-prima reciclável foi disponibilizada através de uma parceria realizada com um órgão da Prefeitura Municipal que possui um volume mensal de descarte significativo de papel. Através da parceria firmada, semanalmente todo o papel é encaminhado à comunidade que, através da técnica artesanal de reprocessamento do material, o transforma em folhas de papel reciclado que, por conseguinte, gera diferenciadas caixas para presente.
Por sua vez, as caixas são trabalhadas no sentido de receberem uma decoração feita de origamis. Que acabam por embelezar de forma significativa o produto.
Todo o processo de confecção é realizado manualmente. O que agrega às peças aspectos de natureza emocional, na medida em que conferem aos produtos características singulares.
A transmissão das técnicas utilizadas foi compartilhada com os integrantes do CEPMMM através de oficinas.

O processo de reciclagem artesanal de papeis

No projeto de intervenção feito ao CEPMMM, pode ser realizada uma ponte entre a comunidade e o Complexo Administrativo da Prefeitura Municipal de Caruaru que desperdiçava aproximadamente 15 kg de papel por dia, perfazendo um total de cerca de 300 kg por mês.
O papel doado passou a ser reciclado através de técnicas artesanais. Para a confecção deste tipo de papel é necessário seguir algumas etapas, que embora simplórias, proporcionam um excelente resultado final. Inicialmente é preciso coletar os papéis que seriam direcionados ao descarte (no nosso caso, o papel é oriundo de doações), logo em sequência, estes são picotados, ficando de molho por aproximadamente 24 horas, para adiante serem processados em liquidificador juntamente com uma razoável quantidade de água. Depois de triturado, o papel torna-se uma massa espessa, que pode ser tingida com corantes naturais, ou produtos atóxicos, como anilina. O passo seguinte consiste na retirada da água existente na massa com o auxílio de um bastidor de tela de nylon semelhante a uma peneira. Essa massa, em seguida, é comprimida por um pedaço de tecido. Após esse processo, o material fica fixo no tecido, sendo retirado com cuidado da peneira e direcionado à secagem, em um varal de roupas com o auxílio de pegadores. Ele permanece ao sol até sua secagem completa, no qual o novo papel assume características distintas frente ao papel convencional, como textura, cor e gramatura.

Resultados

A interferência realizada junto à comunidade na confecção das caixas de papel reciclado trouxe benefícios significativos em uma perspectiva social, na medida em que proporcionou contribuições em aspectos sustentáveis de natureza social, ambiental e econômica.
Destacando, a princípio, os aspectos ambientais remetidos às caixas confeccionadas, foi feita uma análise a fim de identificar o grau de eficiência ecológica atribuída ao artefato.
Fiksel (1996) apresenta em sua obra, ‘‘Design for Environment’’, um série de práticas que embasam a implementação de princípios do ecodesign em empresas. A partir destes conceitos, é possível ser feito um estudo do artefato e definir o nível de ecoeficiência do mesmo (Tabela 02).
A análise feita revelou a existência de 92,3% do total de práticas eco-eficientes adotadas na produção do produto. O único item que discorda a essa relação corresponde a não utilização de materiais contaminantes deu-se pelo fato do uso de cola branca no processo de confecção das caixas. Logo, esta foi à opção menos agressiva encontrada, se comparada a outros materiais fixadores, pois apresenta água em sua composição, além de ser utilizada em quantidades mínimas na confecção das caixas.
Fazendo, ainda, uma análise no ciclo de vida do produto, podemos averiguar mais características positivas atribuídas às caixas de papel reciclado.
A priori, no processo de pré-produção, o material escolhido foi o papel, que, em sua essência, é de natureza renovável. Este foi submetido a um processo de reciclagem artesanal.
Tal processo promove um insignificante impacto ambiental se comparado à reciclagem feita industrialmente, que, por sua vez, é passível de alto nível de desgaste ambiental.
Na produção, as folhas produzidas são quase que totalmente utilizadas, desperdiçandose apenas algumas aparas que, por conseguinte, são incorporadas na mistura para a produção de outras folhas de papel reciclado.
No acabamento, optou-se por não utilizar nenhum tipo de verniz ou tintura, para não trazer as peças o uso de materiais que dificultem o processo de degradação do papel, assim como para atribuir um aspecto rústico, porém original, ao produto.
O transporte e armazenamento são facilitados tanto pelo tamanho reduzido das peças quanto pelo formato das caixas por possibilitarem ser colocadas umas dentro das outras.
O uso do produto não promove prejuízos ao meio ambiente que, em seu pós-uso pode ser reprocessado, servindo de matéria-prima para a confecção de um novo papel reciclado e, conseqüentemente, de novas caixas de presente.
Com isto, identificamos que, em cada etapa do ciclo de vida do produto, os aspectos ecologicamente corretos foram devidamente contemplados.
Nos aspectos econômicos, podemos destacar as possibilidades de aumento de renda do Centro de Assistência Social Irmãs Maristas, proporcionados pela venda das caixas.
A comunidade, que antes tinha de doações e venda de alguns produtos artesanais a única fonte de recursos monetários, pode, a partir da confecção dos referidos artefatos, incrementar de forma significativa os ganhos a serem incorporados na instituição.
Segue abaixo a relação de despesa e lucro relativos à comercialização das caixas de papel reciclado (Tabela 03 e 04):

Considerações finais

A sustentabilidade aplicada ao design, numa intervenção social que visa trazer melhorias a determinado grupo carente, é o meio mais eficaz para modificar os conceitos e atribuições que a sociedade geralmente formula sobre o design e seus valores, sendo estes, geralmente relacionados às características mais relevantes do regime capitalista, onde o lucro é prioridade independentemente de qualquer agressão ambiental.
Neste caso, o design é visto como fonte atribuidora de valor estético aos produtos, aguçando o consumo a cada novo modelo lançado, criando os modismos fugazes, que levam ao descarte imediato antes mesmo que o produto chegue ao seu real tempo de vida útil.
Origina-se assim o acúmulo de toneladas de lixo no meio ambiente, alterando diversos ecossistemas e hostilizando cada vez mais o nosso habitat.
Desta forma, foram planejados e projetados produtos sustentáveis que contemplam os aspectos sócio-ambientais desde a projetação, execução e fabricação, consumo e utilização, até o fim de sua vida útil, apoiando-se no design sustentável e social, para obter resultados satisfatórios para a preservação do meio ambiente. De forma simultânea, foi possível agregar valor aos trabalhos desenvolvidos pela comunidade, aumentando não apenas os resultados financeiros mas fazendo com que os envolvidos nesse processo pudessem se sentir valorizados com o desempenho de um trabalho digno e edificante.

Referências

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FIKSEL, Joseph. Design for environment: creating eco-efficient products and processes. New York: McGraw – Hill, 1996.
KAZAZIAN, Thierry. Design e desenvolvimento sustentável: haverá a idade das coisas leves. 2ª ed. São Paulo: Senac São Paulo, 2005.
LÖBACH, Bernard. Design industrial: bases para a configuração dos produtos industriais. 1ª ed. Rio de Janeiro: Edgard Blucher, 2001.
MANZINI, Ezio; VEZZOLI, Carlo. O desenvolvimento de produtos sustentáveis: os
requisitos ambientais dos produtos industriais. 1ª ed. São Paulo: EDUSP, 2002.
PELTIER, Fabrice; SAPORTA, Henri. Design sustentável: caminhos virtuosos. São Paulo: Senac São Paulo, 2009.
RIBEIRO, Daniel Véras; MORELLI, Márcio Raymundo. Resíduos sólidos: problema ou oportunidade? Rio de Janeiro: Interciência, 2009.
RIUL, M. Ribeiro Filho, J. N. & Wanderley, V. R. S. Sustentabilidade na produção material local. 2º Congresso de Pesquisa e Inovação de Rede Norte Nordeste de Educação Tecnológica, João Pessoa, 2007.
SILVA, Danilo Émmerson Nascimento. Projetando produtos sociais. Recife: Universitária da UFPE, 2009.
TANURE, Raffaela Leane Zenni; OKIMOTO, Claudia. A arte do origami aplicada ao design de produtos. In: Congresso Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento em Design, 7º, Paraná, 09 a 11 Ago. 2006. Anais do 7º Congresso Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento em Design. Paraná: Universidade Federal do Paraná, 2006.




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